Raízes da desigualdade por deficiência:
quais contribuições dos modelos teóricos para compreendê-las?
Raíces de la desigualdad por discapacidad: ¿qué contribuciones ofrecen los modelos teóricos para comprenderlas?
Wederson Santos
Instituto Nacional do Seguro Social/Ministério da Previdência Social, Brasil
santoswederson1983@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-8769-6984
Fecha de Recepción: 17 de Julio de 2024
Fecha de Aceptación: 17 de Septiembre de 2024
Fecha de Publicación: 7 de Noviembre de 2024
Financiamiento:
La investigación fue autofinanciada por el autor
Conflictos de interés:
El autor declara no presentar conflicto de interés.
Correspondencia:
Nombres y Apellidos: Wederson Santos
Correo electrónico: santoswederson1983@gmail.com
Dirección postal: Brasil
Resumo
Com este ensaio, coloco em perspectiva aportes dos estudos da deficiência que buscam descrevê-la como desigualdade, a fim de os aproximar de conceitos de Pierre Bourdieu. Uma das principais afirmações do modelo social ou modelo britânico da deficiência foi explicá-la como opressão pelas barreiras do capitalismo ao corpo com impedimentos (alterações ou lesões) corporais. Quais os limites desse axioma ao descrever a deficiência como desigualdade? Ele é capaz de explicitar as raízes da desigualdade por deficiência? A partir de uma ancoragem na sociologia do corpo, busco analisar como os conceitos de corpo, habitus, hexis corporal e campo em Bourdieu superam dicotomias essencializadoras dos estudos da deficiência em torno dos pólos impedimento/deficiência, para estabelecer uma aproximação entre os conceitos de habitus e interação social, anunciando a ontologia da deficiência em uma apreensão da condição humana. Por fim, coloco em escrutínio o alcance e a validade de modelos propostos no eixo eurocentrista-estadunidense para o contexto do Sul Global, em cenários de capitalismo periférico.
Palavras-chave: deficiência, interação social, desigualdade, Pierre Bourdieu, disability studies.
Resumen
Con este ensayo, pongo en perspectiva las contribuciones de los estudios de la discapacidad que buscaron describir como desigualdad, con el objetivo de acercarlos a los conceptos de Pierre Bourdieu. Una de las principales afirmaciones del modelo social o modelo británico de la discapacidad fue explicarla como una opresión causada por las barreras del capitalismo hacia el cuerpo con impedimentos (alteraciones o lesiones) corporales. ¿Cuáles son los límites de este axioma al describir la discapacidad como desigualdad? ¿Es capaz de explicitar las raíces de la desigualdad por discapacidad? Partiendo de un anclaje en la sociología del cuerpo, buscó analizar cómo los conceptos de cuerpo, habitus, hexis corporal y campo en Bourdieu superan las dicotomías esencializadoras de los estudios de la discapacidad en torno a los polos impedimento/discapacidad, para establecer una aproximación entre los conceptos de habitus e interacción social, anunciando la ontología de la discapacidad en una aprehensión de la condición humana. Finalmente, pongo en escrutinio el alcance y la validez de los modelos propuestos en el eje eurocentrista-estadounidense en el contexto del Sur Global, en escenarios de capitalismo periférico.
Palabras clave: discapacidad, interacción social, desigualdad, Pierre Bourdieu, estudios de la discapacidad.
Introdução
A deficiência tem natureza e causa material. No entanto, como ela se apresenta à percepção não é de modo imediato. Menos ainda é imediata a compreensão dos fundamentos que a sustentam. Negar os postulados do saber médico que aprisionaram o corpo deficiente como déficit biológico e afirmar a deficiência como construção social é o início do processo de entendimento[1], mas não todo ele. O que tem a deficiência que vulnerabiliza e marginaliza as pessoas que a experimentam, deixando-as suscetíveis a diversas situações de desvantagem? Em outras palavras, a desigualdade e a opressão a que as pessoas com deficiência estão submetidas são em função de quê? A explicitação de como se constitui e se manifesta a deficiência, principalmente enquanto efeito de desigualdades, é um processo composto por algumas fases, das quais o impacto das barreiras externas enfrentadas pelas pessoas é apenas uma delas.
Por esse motivo, a centralidade nas barreiras como formadoras da deficiência é uma das principais forças e, paradoxalmente, também fragilidades dentre os argumentos do denominado modelo social da deficiência Goodley[2]; Gustavsson[3]; Shakespeare[4]. Minha hipótese para isso é a de que essa ideia evoca pressuposições de que a desigualdade no capitalismo se daria primordialmente de modo visível e explícito, por elementos apenas tangíveis, como no caso da deficiência são as tecnologias, a renda e as barreiras arquitetônicas, por exemplo. Quando a grande força do capitalismo, na verdade, se sustenta em fundamentos morais invisíveis, inarticulados e inconscientes[5] [6]. Isto é, boa parte da ideologia e da moralidade do capitalismo que exige corpos hábeis e engajados aos sistemas de produção, em suposto contraste ao corpo com deficiência, não é espontânea, nem perceptível de modo imediato e consciente pelos indivíduos que a reproduz, sustentando-a. Elas escamoteiam suas bases para se apresentar em outros signos e símbolos. Processo este que, tanto os modelos teóricos devem auxiliar a compreender e explicitar, quanto uma avaliação caracterizadora da deficiência para fins de reconhecimento de direitos a essa população deve ser capaz de alcançar[7].
Compreender a deficiência como uma expressão da desigualdade é, antes de tudo, reconhecer e tornar articulada e explícita a hierarquia moral que comanda as relações sociais –– isto é, os esquemas de classificação e desclassificação dos indivíduos em função do lugar que materialmente ocupam e podem ou não ocupar na sociedade, para o acesso aos bens e aos direitos, recursos e prestígio, à participação e ao reconhecimento social. Sem um quadro metodológico que localize a deficiência nesses parâmetros, qualquer modelo conceitual da deficiência será insuficiente para representar no plano teórico sua natureza constitutiva e as consequências de sua condição. Pois, assim como em qualquer outra sociedade e cultura, a moral capitalista precisa da produção de corpos específicos para atender suas exigências, uma vez que “cada sociedade produz os corpos de que necessita e, é por isso, que os corpos são depositários da cosmologia política de uma ordem social”[8].
A afirmação de Carolina Ferrante acima nos impele a refletir se os modelos teóricos têm sustentado uma noção de deficiência coerente com esta concepção. Pois, apesar de a afirmação nuclear do modelo social ter a deficiência como opressão pela imposição de barreiras externas ao corpo, é importante refletir acerca do quanto essas premissas estão suficientemente fundamentadas: esse axioma explica de fato tudo o que seus propagadores pressupõem que ele explica? Se não consegue, é possível retomar a abordagem, complementando-a, para manter firme o compromisso do modelo social com a perspectiva crítica ao capitalismo como produtor das deficiências? Como se constitui o efeito dessas barreiras? Elas atravessam o corpo e os ultrapassa, em contornos e substância, modificando-o? Ou, pelo contrário, elas não ultrapassam a matéria corporal, apenas a impede de desempenhar atribuições que lhe são próprias, mantendo seu conteúdo inalterado? Isso nos leva à ideia de que se as barreiras promovem tais efeitos sobre o corpo, reconstituindo-o, é porque ele é dotado de substrato flexível e maleável, sempre inacabado, como defende David Harvey[9]. Então, se assim for, têm os corpos a capacidade de desviarem dos efeitos das barreiras e se projetarem de forma a se proteger dos danos causados por elas? E se, do contrário, os corpos não são constituídos de instâncias flexíveis e maleáveis, os efeitos das barreiras sempre os atingem? Assumir essa última perspectiva não significaria reificar os corpos e as barreiras, em suas características essencializadas, coisificadas, em processo semelhante ao que o modelo médico postulou entre os pólos opostos corpo-anormalidade? E, do contrário, se se assumir a primeira perspectiva, a da flexibilidade e maleabilidade da matéria corporal, isso não levaria a reduzir o papel das barreiras enquanto fatores externos na dinâmica da opressão e da desigualdade pela deficiência?
Se quiser a pretensão de representar a deficiência como construção social, sobretudo, alçada à condição de desigualdade, um modelo teórico convincente necessita dialogar de forma translúcida com estes questionamentos. Pretendo defender que o dilema acima exposto, instalado no interior do principal argumento do modelo social, emerge de uma concepção incompleta e distorcida acerca do estatuto do corpo, sobre sua dinâmica com a sociedade e sobre como a deficiência não foi apropriadamente capturada em decorrência da relação intermediada pela moralidade e pela cultura do entorno que a cerca, a enreda e a constitui. Parto da constatação de que as bases morais da desigualdade por deficiência e como elas operam como elementos subjacentes à produção do corpo e, por consequência, à sustentação do capacitismo, tem sido assunto sobejamente negligenciado na literatura até então[10] [11]. Aspecto ignorado não apenas pelas primeiras perspectivas teóricas de base marxista do modelo social britânico, mas principalmente por correntes denominadas de estudos críticos da deficiência, a partir dos anos 2000[12] [13] , de base culturalista e pós-estruturalista, muitas delas ancoradas nos aportes teóricos de Michel Foucault e da teoria queer/crip.
O objetivo deste ensaio é colocar em perspectiva elementos dos principais modelos conceituais de deficiência apresentados nas últimas quatro décadas. Assim, avalio seus alcances e lacunas, sobretudo, quanto às respostas oferecidas à concepção da deficiência como efeito de uma produção material construída socialmente enquanto desigualdade. Não é, por óbvio, uma análise exaustiva da totalidade dos respectivos modelos teóricos, mas um pinçamento de seus principais argumentos e daqueles pontos em destaque com promessas de elucidar a gênese da deficiência e suas consequências para a vida das pessoas. Emulo um quadro de análise a partir da sociologia do corpo e parto da premissa de ter sido deste campo do conhecimento, com suas elaborações, potencialidades e dualidades que boa parte dos estudos da deficiência se consolidou.
O centro de minhas argumentações está em discutir os conceitos de corpo, habitus, hexis corporal e campo em Pierre Bourdieu, buscando investigar potencialidades dessas propostas conceituais em contribuir com formulações ao tema da deficiência como desigualdade. Com isso, acabo por colocar em escrutínio a validade de modelos propostos no eixo eurocentrista-estadunidense para o contexto do Sul Global, em cenários de capitalismo periférico. Para, assim, apresentar um enfoque como resultante da singularidade periférica como base de desvantagens classificatórias a partir de diferenças corporais, que colocam as pessoas no enfrentamento cotidiano de contingências materiais para interagir socialmente: como nenhum outro grupo social, pessoas com deficiência tornam-se reféns de seus próprios corpos[14] em um mundo em que as mede, as reduz e as classifica pelo que seu esquema corpóreo oferece e não oferece de força muscular e energia corporal para estruturação e reprodução dos arranjos sociais e, sobretudo, de seus valores econômicos.
Segundo David Le Breton, “o corpo é o vetor semântico pelo qual a evidência da relação com o mundo é constituída”[15]. Para ele, portanto, uma das principais tarefas da sociologia do corpo, para negar a ideia modernista de que a condição corporal é lugar de rompimento e de cisão pela diferenciação individual, seria “torná-lo não um lugar da exclusão, mas o da inclusão, que não seja mais o que interrompe, distinguindo o indivíduo e separando-o dos outros, mas o conector que o une aos outros”[16]. Apesar de essa ideia ser um ponto nodal ao campo da sociologia do corpo –– com a respectiva delegação de competência assumida de forma vigorosa por expoentes na sociologia contemporânea, de Norbert Elias a Jean Baudrillard, passando por Talcott Parsons, Erving Goffman, Michel Foucault, Pierre Bourdieu e George Vigarello –– Len Breton sabe que essa pretensão é difícil de alcançar pela natureza em si diversa das ciências sociais, com seus distintos métodos, objetivos e enfoques. Pelo menos desde Norbert Elias, em O processo civilizatório, originalmente publicado em dois volumes em 1939, o complexo corporal é inexoravelmente um objeto sociológico, com jugo capaz de explicar a própria constituição dos arranjos sociais. Ele foi o primeiro a conceber a condição humana, na própria acepção do processo civilizatório, como decorrente dos efeitos de “condicionamento e adestramento” dos movimentos do corpo[17].
De lá para cá, poucas correntes teóricas nas ciências sociais se abstiveram da tarefa de elaborar compreensões sobre o corpo enquanto objeto do pensamento sociológico[18]. No entanto, Len Breton classifica em etapas a forma como as ciências sociais elaboraram reflexões sobre a corporeidade, são elas: uma sociologia implícita do corpo, uma sociologia em pontilhado e, enfim, uma sociologia do corpo, esta última com achados e temas principais de contribuições que “inclinam-se mais diretamente sobre o corpo, estabelece as lógicas sociais e culturais que nele se propagam”[19]. E são exatamente dessas correntes teóricas, com suas características atinentes a cada etapa classificada por Le Breton de limitações e potencialidades próprias, que os estudos da deficiência vão se valer para proposições questionadoras e críticas a modelos tradicionais de compreensão da deficiência, principalmente do modelo médico e do modelo reabilitador[20] [21] [22] [23] [24] [25]. Foi o que ocorreu com uma das primeiras tentativas contemporâneas de afastar a deficiência do campo biomédico, aproximando-a das ciências sociais, realizada por Talcott Parsons em 1951, muito embora sobre uma perspectiva funcionalista[26].
Na área geral da sociologia da deficiência iniciada por Parsons, o campo começou a se consolidar com o aumento de publicações e o interesse pela área foi ganhando força dos anos 1950 a 1970[27], tendo o elemento em comum nessas obras a crítica ao discurso médico como único recurso explicativo para a deficiência, ao passo que as ciências sociais foram se consolidando como narrativa alternativa. Mas foi, sem dúvidas, a vasta produção teórica de Erving Goffman a responsável por impulsionar o debate acerca da deficiência enquanto construção social, o que influenciou inclusive os estudos da deficiência de forma definitiva no final dos anos 1970. Muito embora reconhecer tal influência não fora admitida ao longo de muitos anos pelos principais teóricos das abordagens do modelo social[28] [29].
Para Goffman, os próprios ambientes sociais estabelecem parâmetros e valores sobre a expectativa do normal e do patológico e, consequentemente, quais tipos de pessoas têm maior possibilidade de serem consideradas membros normais de cada um desses ambientes e aqueles cujos atributos depreciativos sofrerão repugnância e exclusão[30]. Esse processo classificatório se dá no jogo cotidiano das interações sociais e pela construção da expectativa de identidade social condizente com certo ambiente. Ou seja, quando uma pessoa com características diferentes daquelas que se esperava encontrar em determinado ambiente é apresentada ou é vista fazendo parte dele, essa pessoa é considerada estranha, reduzida a sua marca corporal, ao seu estigma, tendo reduzidos inclusive o valor e a consideração social dos demais atribuídos a ela[31]. As pessoas com marcas corporais específicas ou com lesões experimentam a noção da identidade deteriorada por serem consideradas como não-pertencentes a determinados ambientes sociais e às expectativas de relações sociais produzidas pelos processos de sociabilização.
Foram exatos três anos depois de Goffman publicar seu Estigma, Paul Hunt publica em 1966 Stigma: A Critical Condition, considerados autor e livro inaugurais do modelo social da deficiência, sem, no entanto, mencionar a obra goffmaniana[32] [33]. Contribuições sociológicas tão profundas e inovadoras quanto as de Goffman não poderiam ter sido desconsideradas, não importa a perspectiva metodológica que se assume em pretensa abordagem questionadora a modelos tradicionais[34]. Este fato iniciou uma longa trajetória de críticas de teóricos do modelo social às elaborações de Goffman[35] [36] [37]. Essa negação à teoria goffmaniana pelos primeiros autores do modelo social, entretanto, aliada ao fato de correntes marxistas terem uma abordagem do corpo meramente por uma “sociologia implícita”, segundo a classificação de Le Breton[38], vai trazer consequências com lacunas inadiáveis de serem preenchidas nos anos subsequentes, ainda que apareçam sob críticas e proposições adicionais por correntes teóricas de diferentes matizes.
Para a proposta marxiana ao longo do século XIX, foi essencial revelar a condição miserável da classe trabalhadora no contexto da Revolução Industrial, cujos aspectos relacionados ao corpo se deram apenas de forma tangencial[39] [40]. Muito embora nos escritos de Karl Marx a corporeidade não seja “objeto de estudo à parte, ela é subsumida nos indicadores ligados aos problemas de saúde pública ou de relações específicas ao trabalho”[41], a filosofia que sustenta o raciocínio de Marx contém consideráveis “dimensões entrelaçadas com a ideia de que um verdadeiro ser humano é alguém que utiliza constantemente as capacidades corporais para criar”[42]. É dessa perspectiva marxista obtusa sobre o corpo –– muitas vezes ignorada ou minimizada por quem as segue –– que os teóricos do modelo social partiram para elaborar a formulação de que o corpo com deficiência é produto dos arranjos opressores do sistema capitalista[43]. É importante reconhecer esta limitação específica da abordagem marxista acerca do corpo, pois ela trará sérias implicações mais tarde para abordagens se desdobrarem no marco dos estudos da deficiência, conforme salienta Dan Goodley sobre a interdisciplinaridade do campo (2016), com propostas que respondem satisfatoriamente ou não a esses desajustes.
O pioneirismo britânico nos estudos da deficiência consolidou-se com a formação do denominado modelo social da deficiência –– movimento teórico e político de crítica ao modelo biomédico[44]. A teoria do modelo social é creditada à apresentação feita pela primeira vez por Michael Oliver em 1983[45]. Por sua vez, sua proposta teórica derivou fortemente do documento Princípios Fundamentais da Deficiência publicado pela primeira vez em meados da década de 1970 pela Union of Physically Impaired Against Segregation (UPIAS)[46]. A tese central do modelo social era de que a desigualdade pela deficiência não estava apenas nos impedimentos (lesões ou alterações) corporais, mas constituída nas várias barreiras físicas, econômicas, políticas e sociais da vida em sociedade para as pessoas com deficiência[47]. Segundo Michael Oliver,
todos os deficientes experimentam a deficiência como uma restrição social, não importando se estas restrições ocorrem em consequência de ambientes inacessíveis, de noções questionáveis de inteligência e competência social, se da inabilidade da população em geral em utilizar a linguagem de sinais [...] [48].
Dessa maneira, o modelo social, ao resistir à redução da deficiência aos impedimentos (lesões ou alterações) corporais, oferece instrumentos analíticos e políticos mais poderosos para o ativismo social em torno da deficiência do que os biomédicos. As abordagens principais do modelo social tiveram o mérito de deslocar para a organização da sociedade a necessidade de enfrentar a deficiência como uma questão pública, e não mais somente restrita à esfera privada e de cuidados familiares.
Há dois questionamentos principais, no entanto, colocados nos últimos vinte anos capazes de desafiar a força argumentativa do modelo social, seu poder explicativo, suas bases epistemológicas, seus desdobramentos políticos e sociais, isto é, suas influências no mundo cotidiano e institucional. Os dois pontos guardam relação intrínseca com concepções sobre o corpo, o modo de concebê-lo e, principalmente, situá-lo como fator produtor e ao mesmo tempo produto das relações sociais. O primeiro deles é acerca de como as barreiras são insuficientes para determinar a deficiência[49] [50]. Em segundo lugar, é notável o papel do modelo social da deficiência em ter abalado as bases secularmente hegemônicas de explicação da deficiência pelo modelo médico que traduzia o corpo deficiente como anormalidade, instância deficitária, abjeta e de incapacidade individual. Todavia, para tal feito, uma diferenciação conceitual importante foi proposta pelo modelo social entre impedimentos (lesões ou alterações) corporais (biológico) e deficiência (produção social e cultural). Operação semelhante à contribuição dos estudos de gênero sobre o deslocamento em torno das noções de sexo (biológico) e gênero (produção social e cultural). Contudo, esse dualismo contribuiu para estabelecer uma dicotomia[51], autonomizando cada um de seus pólos, quase naturalizando-os de forma estanque, e dificultando, portanto, a consolidação dos pressupostos do próprio modelo social que concebe a deficiência como desigualdade resultante de interações entre as pessoas e as barreiras.
Se o corpo é aquela matéria biológica a priori, dada previamente, a partir da qual as relações sociais vão se estabelecer, impondo seus limites e restrições, oprimindo o corpo e colocando-o em uma situação de desvantagem se comparado ao corpo sem deficiência, uma das consequências é a reificação, nos termos de Axel Honneth (2018), dessa produção. Isso provoca e a um só tempo reforça um essencialismo dos dois pólos deste constructo –– exatamente a principal crítica feita ao modelo médico que essencializava o corpo como anormalidade, reduzindo a corporeidade ao déficit, por assumir um status ontológico separado de sua produção social[52].
Tom Shakespeare (2006) é um dos principais expoentes dos estudos da deficiência a denunciar o risco desse essencialismo. Shakespeare pondera em sua perspectiva para não “definir simplesmente a deficiência como as barreiras externas incapacitantes ou a opressão”[53], a fim de evitar tanto o essencialismo do corpo na acepção do modelo médico, quanto o que ele menciona que Marten Söder (1989) definiu como um “essencialismo contextual”[54]. Para Shakespeare (2006), muitos problemas associados à deficiência “não podem ser totalmente eliminados por qualquer forma imaginável de arranjos sociais”[55]. A prioridade, segundo ele, portanto, deveria ser uma política progressista em matéria de deficiência para envolver-se efetivamente com o corpo com deficiência e não o ignorar[56]. E conclui,
“a diferença entre a minha abordagem e o que o modelo social descreveria como modelo médico é que não explico a deficiência apenas em termos do impedimento. A minha abordagem é não reducionista, porque aceito que as limitações são sempre experienciadas como uma interação de deficiências com contextos e ambientes específicos”[57].
Dentre outras forças, a abordagem interacional defendida por Shakespeare tem a capacidade de ultrapassar o reducionismo do modelo médico sobre o corpo anormal, ao mesmo tempo em que aprofunda a abordagem relacional da deficiência proposta introdutoriamente pelo modelo social, dando a ela substância, com a recolocação da dimensão corporal nessa modelagem. Shakespeare não foi o único, dentre os teóricos dos estudos da deficiência, a propor uma abordagem que reconsiderasse o corpo. Carol Thomas (2002; 2007) e Susan Wendell (1996) foram teóricas feministas a trazerem análises de que a retórica do modelo social, no intuito de enfatizar os aspectos materiais das barreiras restritivas, ignorou a dimensão corporal de forma significativa, provocando um “esquecimento” ou “apagamento” do corpo. Entre as contribuições delas ao debate, foi defendida a importância do cuidado e exigiram uma discussão sobre os gravemente deficientes –– aqueles cuja gravidade do impedimento jamais serão independentes e produtivos para a vida social, não importando quais ajustes arquitetônicos ou de transporte sejam promovidos[58].
Somadas à proposta de Shakespeare, as abordagens feministas e também as pós-estruturalistas ancoradas nos estudos de Michel Foucault propuseram elaborações para denunciar os riscos envolvidos no dualismo impedimento/deficiência reforçada pela primeira leva das abordagens teóricas do modelo social[59] [60] [61] [62] [63] [64]. É, desse modo, indiscutível que o modelo social tenha como um de seus principais trunfos ter se colocado contra a demanda normalizadora da ordem capitalista de que as pessoas com deficiência é que deveriam se adequar aos ambientes sociais e suas exigências[65].Isto possibilitou novas frentes, abrindo novas perspectivas em torno de direitos, leis, políticas públicas, ações governamentais e mudanças culturais, tendo por base as demandas na esfera da ética e da justiça para melhor acolher a diversidade do corpo com deficiência e suas necessidades[66].
No entanto, para superar as dicotomias cartesianas semelhantes às do modelo médico –– exatamente aquelas criticadas pela geração britânica do modelo social, inclusive, o que deu origem a ele –– as teorias do modelo social necessitam ampliar suas bases e horizontes e, por sua vez, os estudos da deficiência necessitam problematizar a construção social da deficiência a partir do enfrentamento de lacunas e complementaridades entre as abordagens materialistas, pós-estruturalistas, fenomenológicas, culturalistas, institucionais, políticas, entre outras[67]. As investigações e reflexões aqui neste ensaio articulam-se exatamente a esse projeto requerido por Abram Anders.
Quando se requer elaborações acerca da construção social do corpo e suas repercussões políticas, Foucault foi um dos autores mais acionados, não à toa com vasta produção nos últimos anos no campo dos estudos da deficiência baseada nas abordagens dele e em seus conceitos[68] [69]. Sua relevância para os estudos contemporâneos da deficiência reside, sobretudo, na “sua teorização do corpo como um espaço completamente e inexoravelmente politizado”[70]. Entretanto, a obra de Foucault acaba por reificar e naturalizar os impedimentos (lesões ou alterações) corporais pela abordagem que assume dos fundamentos transhistóricos e transculturais, em que o corpo é um lugar onde regimes de discurso e poder se inscrevem, isto é, pressupondo uma matéria, um volume ontológico do corpo[71]. Ora, se o corpo é uma matéria a partir da qual a inscrição produzirá sentidos, há uma ontologia do corpo contradita naquilo que Foucault assume como desconstrução histórica contínua[72].
Sigo Judith Butler em sua crítica à perspectiva de corpo em Foucault no texto Foucault e o paradoxo das inscrições corporais de que “a distinção [entre o ato histórico e corpo como superfície] não somente opera como uma premissa aceita acriticamente e formulada implicitamente em seu argumento [de Foucault], mas isto termina comprometendo o ponto central concernente ao status construído dos corpos que o argumento deveria provar”[73]. É comum encontrar leituras de Foucault nos chamados estudos críticos da deficiência em que os impedimentos (lesões e alterações) corporais têm sido considerados como condições eles mesmos criados por fatores sociais e arranjos econômicos[74], no entanto, para Foucault, “o corpo não seria regulado por uma relação exterior de poder” [75], isto é, para ele “não há o exterior de efeitos históricos e de operações sócio-políticas do poder sobre o corpo”[76].
De acordo com Butler, “para Foucault, valores culturais emergem como o resultado de uma inscrição no corpo, onde o corpo é compreendido como um meio, certamente, uma página em branco, um incomum, com certeza, pois parece sangrar e sofrer sob a pressão de um instrumento de escrita”[77]. E, além disso, segue ela, “mantendo um corpo prévio à sua inscrição cultural, Foucault parece assumir uma materialidade para o corpo anterior à sua significação e forma”. Por sua vez, o corpo, para Butler, não é um lugar onde acontece uma construção, “é uma destruição em cuja ocasião o sujeito é formado”[78]. Assim, a formação desse sujeito é ao mesmo tempo, “o enquadramento, a subordinação e a regulação do corpo, e o modo como essa destruição é preservada (no sentido de sustentada e embalsamada) na normalização”[79]. Dessa maneira, as conclusões foucaultianas sobre o corpo podem trazer desafios adicionais aos estudos da deficiência em suas abordagens questionadoras do status reificado das instâncias corporais, em vez de demovê-los, como algumas perspectivas dos estudos críticos da deficiência açodadamente apostaram nas últimas duas décadas.
Boa parte dos estudos críticos da deficiência procurou desconstruir de forma primordial as distinções binárias as quais são usadas para criar diferenças e hierarquias e obscurecer conexões entre pessoas com e sem deficiência[80] [81] [82]. Baseando-se nas ideias de Butler sobre os processos de normalização dos corpos, por exemplo, Robert McRuer (2002; 2006) justapõe a heterossexualidade compulsória à capacidade corporal compulsória, argumentando similarmente que, privilegiar tanto a heterossexualidade quanto a capacidade corporal plena, age em detrimento dos outros e das diferenças. Isto é, para ele há “um sistema de capacidade corporal compulsória que produz deficiência”[83]. Para McRuer, os corpos de muitas das pessoas com deficiência costumam ser sempre assumidos como indesejáveis, sobretudo por representarem uma espécie de ameaça ao modelo de reprodução social dominante no mundo moderno[84]. Apesar de ser um enfoque poderoso para inscrever a percepção da deficiência em uma lógica da reprodução cultural, tal abordagem não passou livre de críticas[85] [86] [87] [88], em que até apontam sua força argumentativa dentro dos estudos culturais, entretanto, limitada a um certo alcance específico muitas vezes não problematizado.
Simo Vehmas tem sido um dos autores a questionar os limites dos estudos críticos da deficiência[89] [90]. É apontado por ele que esse campo dos estudos, assim como o modelo social, não contém uma abordagem normativa clara para as experiências vividas, incorporadas e viscerais de ter uma deficiência. Segundo Vehmas, “os estudos críticos da deficiência não se envolvem com questões éticas relacionadas com o papel da deficiência e da incapacidade no bem-estar das pessoas e com as questões pragmáticas e mundanas da vida cotidiana”[91]. Já para Mark Sherry (2004), a teoria crip acaba por promover uma agenda performativa limitada que está desconectada das necessidades reais da comunidade com deficiência, compactando as experiências vividas dessas pessoas a uma concepção física monolítica. Em argumento semelhante, Kirstin Mary Bone (2017) aponta que “McRuer e os outros teóricos da crip confinam a deficiência; a estrutura [teórica] depende de a deficiência ser imediatamente visível”[92]). Andrew Jenks ainda acrescenta a essas críticas que a forma como McRuer apresenta o poder da capacidade compulsória “para criar um sujeito-cidadão ideal e empurrar as pessoas queer/deficientes para a periferia, baseia-se em suposições a priori e em essencialismos que não são explicitamente definidos no texto”[93].
A condição dos seres humanos é de seres dialógicos. Portanto, o significado dos impedimentos (lesões ou alterações) corporais e da deficiência, com seu respectivo impacto no bem-estar, tenderá a ser percebido e consolidado sempre em termos comparativos, relacionais. Como argumenta Andrew Sayer (2011), as pessoas medem a si mesmas não tanto por padrões absolutos, mas por aquilo que os outros são em comparação, em contextos, particularmente com aqueles com quem mais se associam e interagem no cotidiano. Além disso, falta às teorias de deficiência enfoques que levem a sério a perspectiva de que o tema da deficiência produz escolhas éticas práticas e, ao mesmo tempo, difíceis para as quais carece de pontos de vista mais concretos do que as ideias fornecidas pela ideologia da normalidade cunhada pelos estudos críticos da deficiência, que oferece muito pouca orientação moral prática[94].
Acrescentaria que a abordagem crip de McRuer comete, pelo menos, dois deslizes teórico-metodológicos ao buscar compor a deficiência pela aproximação com as abordagens da teoria queer. Primeiro, em um equívoco do tipo idealista, ao tomar o seu sistema de capacidade corporal compulsória como conceito de tipo-ideal, em termos weberianos, no entanto, dando equivocadamente a ele o poder de produzir práticas componentes da realidade, em um erro na elaboração de conhecimento teórico do mundo social que Bourdieu chamou de paralogia, “é escorregar do modelo da realidade para a realidade do modelo” (Bourdieu, 2003, pág 51). Assim, a proposta de McRuer reifica abstrações, por um paralogismo que consiste em “tratar os objetos construídos pela ciência [...] como realidades autônomas, dotadas de eficácia social” (Bourdieu, 2003, pág 48). Em segundo lugar, ele incorre em um erro de base lógica na argumentação, ao explicar a causalidade de um fenômeno por um efeito que ocorre a posteriori, como assinala a crítica de Renato Perissinoto (2010) às explicações do tipo funcionalista. A deficiência, no entanto, precisa ser explicada pelas causas que antecedem a sua produção e não pelos efeitos decorrentes assumidos como funcionais a um sistema social abrangente que enquadra como incapaz e abjeta a deficiência que já fora produzida socialmente. Ao defender a produção da deficiência pelo esquema da capacidade compulsória do corpo, a abordagem crip não confere a devida atenção às reais causas da produção material da deficiência, em termos de desigualdade de participação, que pretensamente almeja explicar. E, no máximo, assume as consequências da deficiência como elementos constituintes da reprodução cultural como se fossem elas mesmas as causas do fenômeno.
É possível ativistas e acadêmicos terem colocado expectativas e consequências demais sob o guarda-chuva do sistema de capacidade corporal compulsória de McRuer que são, antes, resultado de diferenças pragmáticas e desvantajosas às pessoas com deficiência, ainda que elas sejam interacionalmente determinadas. É compromisso ético e político de qualquer pessoa que aspira a um mundo mais justo e próspero se perguntar quais são as reais desvantagens em função da deficiência, acima de tudo, se inquietar não somente acerca de como essas desigualdades alimentam uma cultura de aniquilamento da diversidade –– como a teoria crip sugere ––, mas destinar de forma vigorosa esforços teórico-metodológicos para explicar a gênese da deficiência em sua natureza relacional e as desigualdades inerentes a ela. Há diferenças corporais que, pelas barreiras enfrentadas, levam as pessoas a experimentarem restrição nas interações e participação que nada tem a ver com valores abstratos da ideologia da normalidade. Mas tem a ver, sobretudo, com vivências profundamente contextualizadas e situadas, alicerçadas por valores morais, gerando desvantagens e desigualdades materiais concretas, o que reduz de modo significativo a autonomia entendida como a participação efetiva das pessoas na sociedade.
Falta aos estudos críticos da deficiência, portanto, abordagens que acomodem uma dimensão moral a partir da qual a desigualdade pela deficiência se assentaria e se estruturaria. Seguindo Simo Vehmas e Nick Watson (2014), como o aparato social e o bem-estar das pessoas estão relacionados com a forma como a sociedade está organizada e como seus valores e práticas incidem sobre os corpos, portanto, é imprescindível em uma teoria da deficiência haver um entendimento sobre as desvantagens inerentes e uma maneira razoável e não arbitrária de compará-las, a fim de corrigi-las. Como afirma Jessé Souza (2021), uma ciência crítica verdadeira tem que articular, isto é, reconstruir e explicitar “as bases morais do comportamento individual e social, materializadas em concepções de justiça implícitas e inarticuladas. E em seguida denunciar os vários processos de ocultação e distorção de que somos vítimas”[95]. Em abordagens não emancipatórias da deficiência, tem sido uma máxima a indexação da deficiência enquanto anormalidade, incapacidade corporal, problemas de saúde, corporeidade abjeta, desvio estético, dentre outros redutores das diferenças, sem que, no entanto, deixem explícitas e consistentes as verdadeiras causas e fundamentos de tais condições.
As análises acima apresentadas não têm o intuito de descartar a relevância de nenhuma das abordagens teóricas dos estudos da deficiência. Todas elas, com suas extensões e enfoques, trazem concepções importantes ao campo, cujo objeto ganha densidade à medida que distintas propostas teóricas contribuem com esclarecimentos específicos, desde que conscientes de seus alcances. Realizei apontamentos críticos porque é contínua a necessidade de problematizações em torno da deficiência como desigualdade, em uma perspectiva, sobretudo, de favorecer processos de mudança social, nos termos de Florestan Fernandes (2008). É como se a grande promessa do modelo social ainda não tivesse sido especificamente cumprida. Isto é, a boa-nova de que deficiência é socialmente construída carece ainda de detalhes sobre como se opera, para elucidar suas consequências.
Os termos nos quais a desigualdade por deficiência estrutura-se não ocorrem apenas pela enunciação fenomênica dos fatores externos que a engendram. A relação umbilical entre o corpo e a sociedade é, concretamente, a relação do corpo com outros corpos e como se desenrola essa constituição. A sociedade não existe fora de sua manutenção inscrita e sustentada no espaço corporal. Não há apenas o efeito externo sobre corpos já constituídos. Há a constituição rotineira de corpos pelos efeitos sociais, econômicos e culturais de forma reiterada, reiterando assim a própria existência da sociedade.
Esse parece-me o aspecto central demasiadamente ignorado por distintas correntes teóricas dos estudos da deficiência, como analisado na seção anterior. Seria importante uma abordagem teórica que não somente se preocupasse com o modo como a sociedade lida com o corpo, mas, antes, como ele é em si constituído a partir dessa relação. Um quadro teórico que não se preocupasse somente em como a sociedade forma o corpo, mas como descortinar o fato por vezes ignorado de que o corpo nada mais é do que a própria sociedade e como se dão os processos nos quais ela reiteradamente se constitui nele. Enfim, uma abordagem que partisse da ideia fundamental de que a separação entre corpo e sociedade, na verdade, nunca passou de um devaneio em tentar esquematizar uma cisão que, no fundo, não existe.
Não teria sido a moralidade moderna, pelo individualismo e pelas normas do direito e da medicina, a nos forçar a conceber essa cisão esquemática, em uma quimera com fins ideo-políticos e econômicos, como se tivesse sido ela assim constituída desde o princípio? Não teria sido exatamente este o fato, no contraste com valores ocidentais, posto em análise por Anne-Christine Taylor e Eduardo Viveiros de Castro (2006) ao constatarem a maneira como se concebem o corpo em sociedades indígenas da América do Sul?[96] O que podemos afirmar é que para fazer surgir o sujeito ocidental moderno, aquela cisão foi fundamental. Sem a separação categórica entre corpo e sociedade, a invenção da modernidade não teria sido possível. E separação não em termos conceituais, mas institucionais, sociais e jurídicos.
Quando observamos a sociedade, o que nela testemunhamos é o entrelaçamento de corpos. E quando miramos o corpo, o que assistimos nele é a sociedade concebida. Por que deixamos de perceber de modo instantâneo este fato? É preciso, portanto, extrair a genealogia da deficiência desse aforismo de que somos testemunhas. É preciso conceber um enfoque acerca da deficiência que seja capaz de reconstituir esse desenlace e seus enredos de motivações. E o autor da sociologia do corpo que mais esteve perto de uma empreitada como essa foi sem dúvidas nenhuma Pierre Bourdieu. Proponho a partir de agora uma aproximação com ele nos marcos do modelo social da deficiência, passando a perquirir se os seus conceitos de corpo, habitus, hexis corporal e campo contêm potencial para um quadro de análise sociológica que vise a superação da dicotomia impedimento/deficiência e suas consequências. Principalmente buscando abrir frestas para uma abordagem relacional da deficiência sustentada por bases morais inarticuladas que operam a produção da desigualdade.
Como apresentado, tanto abordagens marxistas, foucaultianas e dos estudos críticos falharam quando buscavam superar a dicotomia impedimento/deficiência, trazendo problemas adicionais aos estudos da deficiência em vez de superá-los. Por sua vez, Bourdieu não está preocupado com o princípio gerador de estruturas como esteve Foucault. Mas com os princípios geradores de práticas que estão subjacentes nas consciências, nas interações e nas condutas, ainda que de forma inconsciente. Ele se “afasta de Foucault, por exemplo, que realiza análises a partir de relações entre elementos, para se ater ao princípio da estrutura, a de uma arquitetura imanente do mundo social que entende as práticas humanas como sustentadas por sistemas de elementos universais”[97]. Para Bourdieu, no entanto, as disposições socialmente constituídas funcionam “no nível prático como categorias de percepção e apreciação, ou como princípios de classificação e simultaneamente como princípios organizadores da ação, significando construir o agente social na sua verdade de operador prático de construção de objetos”[98].
Na proposta bourdieusiana, o corpo assume uma instância encarnada de disposições duradouras, isto é, com esquemas de percepção, pensamento e ação, a que ele denomina de habitus, como princípio gerador de práticas, produzidos histórico e socialmente e incorporados através da socialização e da interação. De imediato, uma das principais contribuições desta abordagem é sua potencialidade em superar dicotomias, dado que o corpo é ele mesmo uma instância encarnada de disposições à ação e à instrumentalidade, produzida e reproduzida pelas práticas e pela história, “uma natureza socialmente constituída”[99].
Em Bourdieu, a relação estabelecida entre a sociedade e o corpo é mais do que uma mera seleção e valorização de corpos biologicamente mais hábeis, normalizados e dóceis às exigências da convivência e da produção material, econômica e simbólica das condições de vida. Para ele,
a instituição [economia e/ou Estado; capital e/ou leis] só é completa e completamente viável caso se objetive duravelmente não somente nas coisas, ou seja, na lógica, transcendente aos agentes singulares, de um campo particular, mas também nos corpos, isto é, nas disposições duráveis em reconhecer e em efetuar as exigências imanentes a esse campo (Bourdieu, 2009, pág 95).
Esse preceito, portanto, é uma modificação essencial da matéria do corpo, tornando sua natureza também social e cultural. O corpo não é só o modo de o indivíduo estar na sociedade, mas é também e, sobretudo, o modo de a sociedade estar no indivíduo (Montagner, 2006), para fazê-la durar, na exata medida em que o corpo também a sustenta. O que significa afirmar a existência de qualquer modo de produção, por exemplo, o capitalismo, porque antes ele alcançou o corpo e nele resiste, tendo encarnado (de forma literal) na estrutura corpórea o princípio de sua manutenção. Isto é, as habilidades, trejeitos, porte e postura, aparência e força física, motricidade, atos de comunicação e memória, destreza, comportamento, atenção focada, disposição física, mental e sensorial correspondem não à natureza biológica, mas, antes, a um lento e histórico processo de modelagem do corpo, ou hexis corporal[100], ao habitus, tendo o esquema corporal como o lugar do senso prático introjetado. Como traz Bourdieu, “a lógica de sua gênese faz do habitus uma série cronologicamente ordenada de estruturas. […] o habitus adquirido na família está no princípio da estruturação das experiências escolares”[101], ao criar os seres como únicos, já que essas identificações afetivas infantis produzem predisposições peculiares para nosso comportamento e nosso aprendizado durante toda a vida.
Ainda que pudessem aparecer em outros termos, as consequências desta distinção entre corpo biológico e corpo social/corpo dotado de habitus foram ignoradas pelas correntes marxistas dos estudos da deficiência e também pelos chamados estudos críticos. E elas são cruciais para uma concepção do estatuto do corpo capaz de superar as dicotomias essencializadoras causadas pelo binômio impedimento/deficiência, além de conceber de uma forma mais matizada a construção social da deficiência como desigualdade, a partir das diferenças corporais em suas relações com o senso prático. Pelas lições de Bourdieu, o que no presente aparenta ser a paisagem de um corpo tido como biológico, em suas habilidades e/ou limitações, é, na verdade, corpo social, “história feita natureza”, cultura encarnada, uma “segunda pele”, pois as disposições incorporadas agora moldaram o corpo[102]. Lembrando Carolina Ferrante (2015) já citada, a ordem social determina então a ordem do corpo, tornando-o “ao mesmo tempo lugar de investimento e princípio de sua eficácia”[103], com as disposições incorporadas ligadas às exigências das relações com o meio social.
Acerca das disposições corporais em Bourdieu, Hermano Roberto Thiry-Cherques (2006) assinala um traço fundamental de que elas,
não são nem mecânicas, nem determinísticas. São plásticas, flexíveis. [...] São adquiridas pela interiorização das estruturas sociais. Portadoras da história individual e coletiva, são de tal forma internalizadas que chegamos a ignorar que existem. São as rotinas corporais e mentais inconscientes, que nos permitem agir sem pensar. O produto de uma aprendizagem, de um processo do qual já não temos mais consciência e que se expressa por uma atitude ‘natural’ de nos conduzirmos em um determinado meio[104].
Importante perceber aqui algumas minúcias da apreensão do corpo em Bourdieu. Pois, de um lado, o corpo social é o corpo material do indivíduo, assim como é para Foucault ou Butler. No entanto, agora portador do habitus, como um sistema de disposições duradouras que geram práticas reguladas voltadas para intencionalidades (estruturas estruturantes) que, foram incorporadas exatamente de saberes e práticas também já constituídas (estruturas estruturadas), antes mesmo de o indivíduo pertencer à sociedade com seu nascimento. O habitus se liga às práticas e não aos discursos, sem passar necessariamente pela consciência, o que não significa reduzi-lo a um aprendizado mecanicista[105]. E essa concepção tem uma vantagem por contornar o aspecto diluído do sujeito pela estrutura, bem como a consequência meramente performativa do corpo, assumida em algumas abordagens pós-estruturalistas.
O processo de socialização se dá na medida em que o corpo do indivíduo, desde a tenra infância, passa a ser moldado para portar o habitus que é próprio ao de seu entorno, a partir de modulações históricas, comportamentais, mas também materiais e culturais até torná-lo corpo social. Um corpo que até preserva seu caráter biológico, por outro lado, agora, de uma “segunda natureza”[106], a partir do processo de socialização e internalização do habitus que, aos poucos, fez com que a pessoa inclusive “se esquecesse” do processo que a constituiu e a moldou, encarnado-o, ao sê-lo agora inconsciente e naturalizado.
Nas afirmações de Bourdieu, “é porque os agentes jamais sabem completamente o que eles fazem que o que eles fazem tem mais sentido do que imaginam” [107]. Desse modo, grande parte da eficácia do habitus é derivada exatamente dessa lógica condicionada de que acabamos por nos esquecer de como ele foi moldado, qual sua origem e como foi a extensão de sua construção histórica, a sua submissão a uma prática pedagógica cotidiana, cindido-o nos mínimos detalhes, passado de adultos para crianças e de adultos para outros adultos em aprendizado mimético, ao longo de toda a vida, o que acabamos por assumi-lo como natural à nossa condição.
Nenhum outro autor como Bourdieu, argumenta Souza (2021), vinculou tão bem a violência simbólica invisível à produção de classes sociais percebidas como fábricas de indivíduos aparelhados para todos os requerimentos sociais. Pois, é o acesso ao capital cultural, nas formas de capital escolar e aprendizado/socialização familiar, que garante a formação de classes sociais em qualquer sociedade, de países de capitalismo central ou periférico. Em abordagem marxista tardia, mas em diálogo com a perspectiva bourdiesiana, Harvey (2004) afirma que o corpo é um projeto inacabado na concepção de que é “relacional, que é criado, delimitado, sustentado e em última análise dissolvido num fluxo espaço-tempo-real de múltiplos processos”. As atividades performativas disponíveis ao corpo são determinadas pelo lugar e pelo tempo e “não são independentes do ambiente tecnológico, físico, social e econômico em que esse corpo tem seu ser”[108]. É por isso que, argumenta Harvey (2004) segundo Staffan Bengtsson, um “estudo do corpo deve basear-se numa compreensão das práticas espaço-temporais reais [...] e das estruturas predominantes de poder político-econômico”[109]. Além disso, Harvey (2004) sublinha que o corpo humano não desempenha apenas um papel passivo e econômico[110]. Pelo contrário, o corpo humano é “ativo e transformador em relação aos processos que o produzem, sustentam e dissolvem”[111]; que deve ser entendido numa perspectiva relacional, pois “conceituar o corpo [o indivíduo e o eu/self] como poroso em relação ao ambiente molda de forma particular as relações ‘eu-outro’ (incluindo a relação com a natureza)”[112].
O que nos leva a pensar que o valor moralmente depreciativo atribuído aos corpos com deficiência, resultante da interação –– elaboração iniciada com Goffman ––, pode ser internalizado como desigualdade incorporada, se utilizarmos os termos bourdiesianos. Isto é, ao utilizar a proposta de Bourdieu, a desigualdade experimentada pelas pessoas com deficiência pode ser nuançada, na verdade, como uma assimetria na incorporação do habitus de classes. Um descompasso por contingências em adquirir habilidades (ainda que não atrelada especificamente ao mero corpo biológico, mas ao da hexis corporal, pela interação dele ao meio), diante das exigências de predisposição à prontidão ao engajamento relacional, ao potencial de produtividade e à disciplina que o ordenamento social exige que os indivíduos cumpram, sob pena de reconhecê-los ou não os reconhecer como engajados, corpos vivíveis, como defende Butler (2018).
Bourdieu está preocupado com a forma como a dominação no capitalismo se dá, sobretudo, em sua incidência sobre o corpo. Isto é, como sua elaboração é fundamental para compreender, de um lado, as desigualdades geradas no capitalismo e, do outro, a própria construção do esquema corporal nesse modo de produção, uma vez que as estruturas estruturantes se depositam no corpo em forma de esquemas de percepção, pensamento e ação. Assim, ele acaba por fornecer uma abordagem para demonstrar como a posição de classe é inscrita no corpo[113] e como, de forma específica, as estruturas estruturadas das relações de dominação, nas quais os indivíduos estão imersos, aparecem de forma oculta fazendo com que eles desconheçam a lógica de sua arbitrariedade.
Em sua perspectiva, Bourdieu assinala que cada corpo é o produto aparente da composição e dos volumes de capitais específicos de classe (que podem ser) acumulados ao longo de uma vida. Isso se dá pelas vantagens na incorporação do habitus que, por sua vez, oculta as condições de possibilidade de sua instalação, tornando-se um quadro de análise poderoso, dependendo da investigação sobre o (des)ajuste entre o capital corporal de alguém e o campo a ele circunscrito[114]. Nesse sentido, não deixa de ser impressionante a quase total ausência de investigações sobre deficiência alicerçadas na teoria de Bourdieu[115] [116] [117] [118], dada a necessidade de abordagens críticas semelhantes à dele.
Ferrante tem sido uma notável exceção no contexto internacional [119]. Com teorizações vigorosas, entre ensaios analíticos e pesquisa empírica, ela tem dado contribuições relevantes em uma perspectiva crítica, tematizando a deficiência à luz da compreensão bourdiesiana de relações de dominação no capitalismo, o que avança em lacunas deixadas por abordagens clássicas do modelo social. Ela parte de uma premissa de que o habitus encarnado é a expressão de uma história coletiva em que as estruturas econômicas e ideológicas determinam as condições de possibilidade para sua expressão (Ferrante; Ferreira, 2010).
Estes aportes são cruciais para a compreensão da construção social da deficiência, uma vez que a abordagem das relações de dominação em Bourdieu ocorre não de modo a pressupor sua efetividade, mas principalmente caracterizando suas ambiguidades (Ferrante; Dukuen, 2016). É a partir deste último ponto que as reflexões aqui estão delineadas. Acredito que, dessa forma, haja uma força para repensar a deficiência em uma perspectiva relacional que, tanto se aproxima da abordagem de Tom Shakespeare, quanto amplia suas análises superando lacunas do modelo social, abrindo brechas para um enquadramento da produção da deficiência a partir de determinantes de desigualdade criados e reproduzidos no capitalismo.
Para Bourdieu, o corpo funciona como um “operador analógico” da prática pelas hierarquias prevalecentes no mundo social (Bourdieu, 2009). O habitus faz de todo o corpo uma “memória” para agir de acordo com as exigências do meio (Montagner, 2006). Foi por uma forma de nomear esse ‘eu profundo’, que não é transparente para nenhum de nós[120], que Bourdieu cunhou o conceito de habitus, exatamente como conjunto de predisposições para o comportamento que incorporamos ao longo de nossa vida e de nossa constituição enquanto indivíduos. É necessário perceber o habitus, pois, como uma dimensão pré-reflexiva ou inconsciente. Sendo assim, se o esquema corporal de um indivíduo não encarna o habitus, ele será desclassificado nas hierarquias que o distinguem e o reconhecem como pertencente à sua classe sócioprodutiva correlata.
A principal desvantagem material de alguém com deficiência, portanto, é a dificuldade em adquirir conhecimento e colocá-lo em prática, não por seus impedimentos (lesões e alterações) corporais, mas pelas barreiras ao corpo enfrentadas na interação. E as dificuldades ocorrem, por diferentes e extensas barreiras, nos dois momentos: pelos fatores ambientais externos que dificultam ou impedem a aquisição de conhecimentos e, na sequência, pelos fatores ambientais externos que dificultam ou impedem as pessoas de colocá-los em prática.
Converter conhecimento prático em engajamento cotidiano –– e também econômico, quando for o caso da produtividade na vida adulta em sociedades capitalistas ––, é fundamental para as pessoas com deficiência não ficarem aprisionadas apenas à sua força muscular e energia corporal como condição de sobrevivência, dadas as contingências pelas diferenças corporais e as desvantagens decorrentes delas. Quanto mais as barreiras atuam para prejudicar a interação social de pessoas com diferenças corporais, mais é comprometida a participação social delas pelas dificuldades no uso de conhecimento tornado pragmático pela vida prática. Ou seja, a restrição na participação social de pessoas com deficiência ocorre quando as barreiras são tão significativas na interação ao ponto de os indivíduos serem desprovidos total ou parcialmente de instrumentalidade para o cotidiano, conhecimentos e habilidades, de orientação e cuidados, formação educacional e profissional, habilidades comunicacionais e laborais, criatividade produtiva e técnica, efeitos das barreiras que enfrentam reiteradamente. Isto reduz suas existências à matéria corporal, deixando-os reféns do corpo estritamente biológico, vez que ausente de conhecimentos úteis somados às dificuldades interacionais em colocá-los em prática.
É nesse sentido que o corpo em Bourdieu não é uma mera construção social (ou destruição, nos termos de Butler), mas, acima de tudo, expressa uma hierarquização pelo senso prático. Em outras palavras, a hierarquia moral sobre as diferenças dos corpos hábeis e viáveis, no conjunto de esquemas sociais a produzirem materialmente o corpo prático, erige exatamente das restrições à interação. É por isso que assumo a interação social como elemento definidor da condição humana. Em termos ontológicos, é o que George Luckács alude como ações interativas ou práxis social interativa, como posições teleológicas de segunda ordem, ao lado do trabalho, como a posição teleológica de primeira ordem[121] [122], segundo Ricardo Antunes, como “formas mais complexificadas da práxis social”[123]. Na ontologia do ser social, a práxis resulta da ação do trabalho enquanto transformação dos meios naturais para subsistência e também de ações interativas responsáveis pela socialização conscientizada e planejada deste aprendizado[124] [125]––, estas últimas, muitas vezes ignoradas na acepção da ontologia e, no entanto, importantes para vislumbrar análises acerca da deficiência. A participação social, desse modo, é acima de tudo uma necessidade humana, cuja exigência precípua está na interação social vista como uma condição de participar. A causa da deficiência seria, portanto, o esforço ou o desgaste para a interação social, para corporificar o habitus em termos bourdiesianos, já que sua incorporação parcial ou fracassada resulta de uma contingência imposta por fatores externos à diversidade corporal na produção dessa relação.
Os princípios de percepção, pensamento e ação do habitus constituintes do senso prático se universalizam, principalmente através da família, da escola e das regras do direito. Refletem a dominação no capitalismo, o que constitui a moral instituída capaz de contribuir com o ordenamento político e econômico (Dukuen, 2015). Consequentemente, ao naturalizar, no corpo, processos da ordem social como o habitus, naturaliza-se também moralidades e desigualdades inerentes, tornando-as automatizadas, intransparentes e inconscientes (Dukuen, 2015), confundindo-se com o corpo natural, borrando os limites entre o biológico e o social-cultural. Como consequência, o habitus naturaliza no corpo e tornam de alguma forma inconscientes as desigualdades da ordem social, como são os diferencias de interação e participação sociais, experimentadas pelas pessoas com deficiência, quando essencializa em seus impedimentos corporais os valores e consequências do corpo como anormalidade.
O melhor exemplo do esquema corporal como contingência social encarnada é a persistência da compreensão de um corpo com deficiência reduzido à ideia de incapacidade para o trabalho. Valor presente tanto no senso comum quanto em práticas sociais institucionalizadas (Santos, 2010). As sociedades, no entanto, sejam elas quais forem, produzem os corpos de que necessitam para a reprodução material de suas condições de existência, atrelando os ciclos de vida de seus membros a um continuum de engajamento à interação. A deficiência manifesta-se a partir de contingências impostas às diferenças corporais quando há rupturas nesse continuum. Assim, o corpo utilitário para as atividades produtivas, o corpo hábil e ativo para o trabalho, é apenas a evidência aparente e naturalizada, produto do final da linha de um continuum de corpos engajados aos imperativos sociais. Eles têm o início de sua produção com a socialização familiar das crianças, depois inseridas no contexto escolar, mas, que aos poucos, circulam em instituições, em diversos outros ambientes de interação, dentre eles o do mundo social do trabalho. Esse continuum é rompido quando, por fatores ambientais e práticas sociais, não ocorre o atendimento de certas expectativas à ordem social, frustradas total ou parcialmente.
A incapacidade para o trabalho é, pois, uma espécie de gaiola ideológica que aprisiona a deficiência como evidência fenomênica primeira (e naturalizada) de um corpo diferencial em relação ao habitus de classe. Isso nos obstaculiza de compreendê-la para além dos limites dessa noção aparente, nos impedindo, sobretudo, de compreender o núcleo essencial de sua desigualdade encarnada no corpo como uma emanação a partir dos óbices à interação social. Como afirma Claudia Briones, “quanto mais óbvio algo parece, mais ideológico ele é” (Briones, 2007). Obstáculo este capaz de explicar a armadilha em que se emaranhou a primeira geração dos teóricos do modelo social da deficiência.
Os arbítrios do capitalismo não estão, desse modo, somente circunscritos a requerimentos por corpos produtivos, docilizados, aptos a serem explorados pela força de trabalho e da criatividade. O empreendimento para forjar corpos viáveis se dá muito antes, pela natureza dos arranjos sociais, pela constituição do habitus, em qualquer sociedade[126], e do habitus de classe na nossa. No caso do capitalismo, em particular, tem-se o objetivo final da eficiência na produção ininterrupta de corpos engajados à atenção produtiva e ao cálculo prospectivo, aos conhecimentos úteis, aos ditames da disciplina e do treino continuado, forjados desde uma longa trajetória de preparação para os sistemas sociais. Essa preparação estrutura-se pela inserção desde muito cedo nas interações sociais, da qual as práticas de educação, de saúde, de ofício e profissionais, entrelaçadas às atribuições familiares, são essenciais para tal engajamento, fruto de interação social contínua. Processo que constitui o campo, em termos de Bourdieu, ao qual o habitus que atinge às pessoas com deficiência se refere. A deficiência, dessa forma, não é uma mera oposição a corpos produtivos: ela representa uma ruptura no continuum de corpos engajados às interações sociais.
As desvantagens materiais e sociais produzidas a partir das barreiras impostas às diferenças inscritas nos corpos das pessoas com deficiência dificultam a calculabilidade instrumental, os atos para a disciplina, a aquisição de conhecimento técnico, de saber prático e também de racionalidade prospectiva. Elementos essenciais para adquirir conhecimento útil (de aplicações funcionais, de cuidados, instrumentais e práticas) derivado do habitus, em que o controle do corpo adquire o sentido de virtude máxima, “necessidade tornada virtude”[127], pelas faculdades inerentes à interação. Pois, o habitus “é adquirido mediante a interação social e, ao mesmo tempo, é o classificador e o organizador desta interação”[128]. Segundo Bourdieu,
Não há formas de interação que não estejam […] também dominadas pela estrutura objetiva das relações entre as condições e as posições perpassadas pela harmonia dos habitus ou dos ethos e dos gostos (sem dúvida pressentindo a partir de índices imperceptíveis da héxis corporal)[129].
O que nos remete a pensar que “a verdade da interação nunca reside inteiramente nela” (Bourdieu, 2003, pág 67), é sempre referenciada a um campo específico do ordenamento social, para sustentá-lo. É nesse sentido que as interações sociais assumem, em Goffman, papel tão relevante enquanto uma ordem da interação. Para ele, essa ordem está na constituição não somente de todo e qualquer arranjo social relevante, pela centralidade dos encontros, ajuntamentos e interações face a face como núcleo daquilo que conhecemos até mesmo como sociedade (Goffman, 2011). Mas principalmente pela própria noção implícita de respeito mútuo surgida nas interações que acaba por funcionar como aspecto basilar constitutivo da própria dignidade humana. Ideia presente não só em Goffman, mas em toda a vigorosa e influente teoria do reconhecimento desenvolvida a partir de Honneth (2000), pela noção de dignidade da abordagem das capacidades humanas apresentada por Martha Nussbaum (2013) ou pela concepção de identidade moderna defendida por Charles Taylor (1997). Noções acerca da dignidade não em seu sentido jurídico, mas como auto respeito mútuo surgido de um certo desiderato de todos em serem tratados na interação de acordo com o valor que acreditam ter diante dos fisicamente presentes.
É este grau de detalhamento do efeito das barreiras sobre o corpo com deficiência na interação que nunca foi elucidado pelos teóricos do modelo social. E, ainda, tão ignorado quanto pelas abordagens dos estudos críticos da deficiência, impedindo de esquematizar teoricamente como a deficiência deve ser apreendida enquanto desigualdade.
Se aplicarmos a noção de corpos dóceis de Foucault aos corpos com deficiência perceberemos o excelente constructo foucaultiano respondendo apenas a uma única dimensão corporal, a da produtividade. Mas o que os arranjos sociais necessitam como condição para sua própria estruturação, incidindo sobre as práticas cotidianas, sendo um arranjo capitalista ou não, é mais do que as contribuições à produtividade: é o engajamento em diversas interações sociais no processo de socialização capaz de fazer nascer o próprio ser humano. Deficiência, dessa forma, pode ser descrita como o somatório de contingências nas interações sociais a partir do efeito de fatores externos à diferença corporal expressa em impedimentos, alterações ou lesões.
Mesmo como um axioma, não deixa de ser carregado de generalizações o argumento nuclear do modelo social de que a deficiência é a opressão ao corpo pelas barreiras do capitalismo. É, no mínimo, uma tese eurocentrada e ocidentalizada que limita a compreensão da deficiência como construção social. Porque as construções sociais são muitas, assim como muitos são os modos pelos quais os corpos são tornados deficientes. As noções de habitus e campo em Bourdieu auxiliam, sem perder a perspectiva crítica, a esmiuçar a abordagem construcionista da deficiência, traduzindo-a a partir das desigualdades decorrentes desta condição, como discutido na seção anterior: por sua teoria da prática (2009), Bourdieu posiciona o indivíduo no espaço social a partir do capital global acumulado por ele, sendo a soma dos capitais econômico, cultural e social. Para as pessoas com deficiência, todavia, esse posicionamento torna-se prejudicado.
As restrições na interação impostas por barreiras funcionam como impeditivos aos indivíduos de adquirirem o habitus (o conjunto encarnado de pré-condições e pressupostos sociais, instrumentais e técnicos para participarem material e socialmente da sociedade). Isto os afasta dos padrões de interação importantes para a socialização e de padrões utilitários oriundos do universo mercantil que, somados, impedem ou dificultam a participação na sociedade e de experimentar o reconhecimento social.
Para ser mais assertiva, no entanto, a proposta bourdiesiana carece de ajustes para acomodar reflexões sobre especificidades de contextos inerentes ao capitalismo periférico, como no Brasil e em todo o Sul Global. Embora o capitalismo tenha se expandido às sombras do racionalismo ocidental, há uma singularidade em sua estruturação em cada canto do Globo. Isto é, a ordem capitalista tem um conjunto de regras que lhes é própria para sua estruturação e reprodução, principalmente no centro de sua concepção. Mas cada contexto territorial, sobretudo os da margem e da periferia do mundo, adquire características específicas que podem negar e reforçar paradoxalmente as leis gerais que a instituíram. Jessé Souza é um sociólogo brasileiro e, quem sabe, um dos principais pensadores na América Latina a buscar elucidar os processos de constituição do capitalismo na periferia do mundo (2003; 2018; 2021). Herdeiro de muitas das reflexões iniciadas por Florestan Fernandes acerca do capitalismo moderno à brasileira e com uma produção intelectual original, Souza partiu do projeto bourdiesiano para explicar as desigualdades da sociedade brasileira como emergentes da constituição do capitalismo periférico.
Para tanto, realiza uma modificação fundamental na teoria de Bourdieu. Pois, apesar de ele não perceber o reconhecimento social como aprendizado, Bourdieu mostra como a distinção social causada pela negação de reconhecimento social aos outros é a base real de todas as relações de dominação entre classes e grupos sociais[130]. Nesse sentido, foi preciso aproximar a teoria do habitus bourdiesiana a uma perspectiva da genealogia e da eficácia de algumas moralidades a respeito das diferenças humanas que informam práticas sociais e institucionais. Para se afastar dos pressupostos do “essencialismo culturalista”, sobre os reducionismos da antinomia centro-periferia do capitalismo mundial assentados no tripé familismo-patrimonialismo-personalismo, Souza vai buscar em Charles Taylor (1997) um complemento para compreender a hierarquia moral que subjaz à elaboração das desigualdades no capitalismo. Naquilo que Souza denomina de “hermenêutica do espaço social”[131], a fim de explicar a naturalização das desigualdades, a partir da qual leva a formas perversas de subcidadania e de marginalização dos sujeitos. Ou seja, para ele, a desigualdade social brasileira não advém do fato de sermos insuficientemente modernos. Nossas contradições sociais seriam fruto do próprio projeto modernizador.
Souza recupera que, para Taylor (1997), instituições como o Estado e o mercado, assim como práticas sociais e culturais, possuem de forma implícita e inarticulada uma interpretação moral prévia acerca do valor diferencial dos seres humanos (Souza, 2003). E, portanto, quaisquer investigações para compreender (e também criticar) o projeto moderno necessita tornar este implícito pano de fundo articulável e consciente, ao reconstituir a genealogia de alguns valores morais, denotando sua eficácia social contemporânea. O ponto de partida de Taylor é investigar a origem de algumas intuições morais, chamadas por ele de avaliações fortes, aquelas por trás da discriminação de tudo que é certo e de tudo que é errado sobre o que nos cerca. E, tão fortemente consideradas, ao ponto de pensarmos nelas como “instintivas e naturais”[132].
Taylor conclui que, a partir de ideias germinadas e cultivadas por séculos, a topografia moral do Ocidente se articula em torno de dois grandes componentes principais: o princípio da interioridade e o princípio da vida cotidiana (Taylor, 1997). O primeiro diz respeito à internalização da faculdade de cognição e controle racional como fontes da moral, “a moralidade passa a ter uma voz interna”[133]. E o segundo, redefine a hierarquia social relacionada às esferas práticas do trabalho e da família, como sendo o lugar das atividades superiores e mais importantes, atingindo a todos, substituindo valores aristocráticos tradicionais e de atividades contemplativas, antes, relegados a uma minoria (Taylor, 1997).
Por um longo processo histórico de transformação, o trabalho útil que contribui de algum modo ao bem comum passou a ser a fonte principal da autoestima individual e consequentemente de reconhecimento social. É o que explica o trabalho cotidiano e utilitário, do interior das famílias à universalização a toda a sociedade, como substância de fonte moral. Segundo Souza (2021), ancorado em Taylor, quem não exerce trabalho útil está condenado, a partir de então, não só à baixa autoestima, como também ao desprezo geral e à exclusão sistemática. Como não se tem controle algum acerca dos mecanismos de atribuição de respeito, consideração e prestígio social, não se controla, portanto, os mecanismos que produzem o desprezo, a indignidade e processos que poderíamos chamar de subcidadania, conforme Souza (2021). Em função disso, Taylor chama de princípio da dignidade a fonte moral que se articula a partir da noção do produtor útil.
Uma limitação nessa proposta de Taylor é, no entanto, percebida por Souza (2003). Segundo ele, ao buscar conceber as hierarquias morais como fundadas no reconhecimento ligado aos princípios da autenticidade e da dignidade, Taylor desconsiderou que, tanto uma quanto outra, só adquirem o valor concreto para hierarquizar os indivíduos a depender do local ocupado na estratificação social e nas formas de se criarem e se reproduzirem materialmente. Souza assume uma proposta teórica, combinando elementos de Taylor com conceitos da teoria dos capitais de Bourdieu, a fim de construir um original quadro de referência conceitual capaz de superar “a descrição fenomenológica das situações que espelham o respeito ou a falta dele, especialmente no seu sentido ‘atitudinal’, infra e ultra jurídico, tentando pôr a nu o ancoramento institucional que lhe confere boa parte de sua opacidade e eficácia”[134].
Produto da contingência econômica e social, o habitus, “esse princípio não escolhido de todas as escolhas”[135] gera a inscrição no corpo das pré-condições sociais ao reconhecimento de classe, resultando na distinção social, isto é, o princípio do respeito mútuo com aprendizado social, tendo esse complexo processo iniciado na infância e reforçado durante toda a fase adulta. Como apontado por Souza (2006), toda sociedade naturaliza as relações sociais contingentes, havendo a produção da ilusio, ou efeito mascarador e encobridor, denominado por Bourdieu de “capital simbólico” (Bourdieu, 2009), como característica específica nas sociedades modernas. Souza chama a atenção de que a principal naturalização das desigualdades no capitalismo, isto é, o maior dos processos de mascaramento da dominação direta reside na “ilusão da igualdade de oportunidades”, como principal base de dominação política das sociedades industriais avançadas[136]. Quando, na verdade, o capitalismo se sustenta e se reproduz a partir das diferenças concretas entre os indivíduos quanto às pré-condições sociais para adquirir o habitus, produzindo as desigualdades constitutivas do próprio ordenamento. Se não fosse a falsa promessa da igualdade de oportunidades, o capitalismo não teria adquirido o poderio que tem. É neste ponto que a contribuição de Souza é fundamental para compreender a singularidade do capitalismo periférico.
Taylor (1997) elabora a sua hermenêutica social valorativa em torno dos conflitos entre o princípio da dignidade e o princípio da autenticidade, como fato gerador do conflito paradigmático das sociedades avançadas. Souza (2003), por seu turno, quer encontrar os fundamentos da distinção social, de Bourdieu (2011), em sociedades de capitalismo periférico pela “redução da distância entre o princípio da dignidade e o princípio da autenticidade”[137]. Isto é, ele busca chegar ao fundamento da desigualdade a partir do descortinamento de como ela pode ser legitimada e tornada invisível, pelas promessas não cumpridas e ilusões, isto é, pela ideologia, mas tornada espontânea e concreta no capitalismo pelos processos de dominação, como é a igualdade formal, a igualdade de oportunidades, a meritocracia, a venda “livre” da força de trabalho, ou a “ideologia da superação” no caso das pessoas com deficiência. Desse modo, para compreender as sociedades de capitalismo periférico, Souza (2003) propõe um prisma composto por três tipos de habitus, e não apenas um, como aquele universal proposto por Bourdieu, de excessivo contextualismo pela centralidade do capitalismo industrial francês do século XX.
Por razões históricas e econômicas, a esquematização da realidade do habitus de classe para se universalizar não se dá nos mesmos moldes em países periféricos e em países centrais. Souza parte de formulações de Fernandes (2008) que, como nenhum outro no Brasil antes, vislumbrou uma concepção alternativa para dar conta de problemas “modernos” de sociedades modernamente periféricas[138]. A partir daí Souza propõe uma subdivisão do habitus de Bourdieu em: habitus primário, habitus secundário e habitus precário[139]. O primeiro é aquele em diálogo com a proposta original de Bourdieu. Ou seja, esquemas avaliativos e disposições para comportamentos encarnados, permitindo a noção de dignidade em termos taylorianos, com eficácia social para o reconhecimento coletivo, atrelado à noção de desempenho, como mecanismo legitimador dos papeis de produtor e cidadão. O habitus secundário, por sua vez, teria como fonte o reconhecimento e respeito social que pressupõe a generalização do habitus primário e institui critérios classificatórios de distinção social, ou seja, a depender de condições históricas, institucionais e econômicas concretas, os indivíduos podem ou não encarnar o habitus secundário. Já o habitus precário é caracterizado pelas disposições de comportamento que não atendem às demandas objetivas para que seja um indivíduo ou um grupo social considerado produtivo e útil, em uma sociedade competitiva, para gozar de reconhecimento social e distinção.
Nessa senda, Jessé Souza (2003) oferece aportes fundamentais para explicar a gênese da desigualdade estrutural brasileira produtora de um contingente monumental de sujeitos localizados no habitus precário, o que responde por nossas aviltantes marginalização e subcidadania de grande parte da população (Souza, 2003; 2018). Isto é, uma distância quase intransponível entre 1. aqueles do grupo minoritário e privilegiado que encarnam os habitus primário ou secundário desde a socialização e herança familiar, com acesso à boa escola, à saúde e oportunidades, tendo reconhecimento social e dignidade, e 2. aqueles de cujo grupo majoritário são dotados de habitus precário, relegados a uma produção de vida e reprodução de sobrevivência envoltas em um conjunto infindável de insegurança social, privações econômicas, vulnerabilidades, violências e restrição de todo o cabedal de condições de exercício da cidadania e dignidade. É exatamente das lições do habitus precário que conseguimos extrair compreensões para perceber as profundas raízes da desigualdade por deficiência, experimentada pela imensa maioria dos indivíduos com tal condição — arriscaria dizer em países de capitalismo periférico e, em menor medida, também nos de capitalismo central.
As condições históricas e econômicas dos países de capitalismo avançado permitem a internalização dos habitus primário e secundário por quase toda sua população. Muito diferentemente de países do Sul Global de capitalismo tardio, em que a maioria da população e, principalmente, grupos com marcadores sociais de desigualdade (minorias étnico-raciais, gênero, idade, deficiência, entre outros), experimentam o habitus precário. Indisponibilidade de educação e saúde a todos, desigualdades regionais e precariedades territoriais, instabilidades político-econômicas gerando oscilações no mercado de trabalho que não incorporam a massa de trabalhadores em ocupações de qualidade, além do baixo potencial das famílias de protegerem e socializarem seus membros para desempenhos e habilidades assimiladas pelos arranjos produtivos determinam de forma fundamental a não internalização do habitus pelos indivíduos nos países periféricos. Assim, por razões já explicadas, pelas dificuldades de internalização do habitus pelas barreiras enfrentadas nas interações, o habitus precário fica relegado à quase totalidade das pessoas com deficiência, desclassificando-as dos espaços de pertencimento, atingindo materialmente sua participação social e consequentemente sua dignidade, nas palavras de Bourdieu, elas “não podem fazer a economia da busca de distinção”[140].
Quando não os desclassifica, por alguns poucos com deficiência a usufruir dos privilégios de classe, tendo acesso suficiente a bens e recursos ao adquirir habitus secundário negado à imensa maioria das pessoas com deficiência, mesmo assim estes sofrem desgastes cotidianos pelos efeitos persistentes e perversos de barreiras ambientais e atitudinais, deteriorando suas condições de possibilidade de interação social. Com vidas precarizadas, distanciadas dos desempenhos e participações que permitem reconhecimento social, se comparado às demais pessoas, a subcidadania das pessoas com deficiência é fruto do processo de constituição de nossa sociedade de classes e não de seu anverso, não de seu atraso. A situação de subcidadania das pessoas com deficiência é tal que encontra correspondência apenas com as situações de marginalização e exclusão sistemática da população preta e parda em nosso país, como explicadas por Souza em seu fundamental Como o racismo criou o Brasil (2021).
Considerações finais
Consolidado a partir dos anos 1980, o modelo social britânico da deficiência foi fundamental para fragilizar a hegemonia do paradigma biomédico responsável por secularmente descrever os corpos com deficiência como anormalidade. No entanto, a explicitação pelo modelo social do caráter essencialmente construído da deficiência se deu às custas de uma essencialização dos pólos dessa dimensão: os impedimentos e os contextos. Uma das consequências da reificação dessa dicotomia foi que ela deixou pouco espaço para demonstração de quais e, sobretudo, como os elementos interagem na produção da deficiência como desigualdade, principalmente aqueles aspectos morais. Por sua vez, essas lacunas provocaram distintas correntes nos anos 1990 e 2000 a buscarem enfoques teórico-metodológicos no intuito de superar tais dualidades. A partir daí, vigorosas análises críticas surgiram. Ao buscar demonstrar que, ainda assim, essas últimas abordagens não foram capazes também de cumprir a promessa central do modelo social, busquei me aproximar de conceitos teóricos de Pierre Bourdieu em uma reconstrução não só da deficiência como desigualdade, mas buscando elucidar como se constrói interacionalmente o próprio estatuto corporal.
A compreensão da deficiência não se resume à sua percepção. A aparência de um corpo com diferenças sinaliza apenas uma parte do todo que constitui a sua produção. Ao se deparar com um usuário de cadeira de rodas na rua, uma pessoa cega na família, uma criança com autismo na escola, uma pessoa com transtornos em acompanhamento na rede de saúde mental, por exemplo, o que testemunhamos não é a deficiência ainda. Ela somente emergirá no momento em que um conjunto de barreiras impostas à interação dessas pessoas com o meio comprometer sistematicamente o engajamento e a participação social delas em processos cotidianos e também produtivos. É nesse sentido que o conceito bourdiesiano de habitus auxilia a detalhar a construção social da deficiência. Porque sua produção não ocorre apenas por evidências tangíveis, como algumas privações materiais no capitalismo são proeminentes como desvantagens. Mas, antes, por hierarquias morais sobre as diferenças como resultado de um longo processo histórico de introjeção do habitus pelas interações cotidianas no esquema corporal que o transforma em produtor de práticas.
O habitus de classe, ao se encarnar no corpo como lógica e princípio gerador de percepções e ações, tem o papel fundamental de determinar a participação dos agentes nas relações cotidianas e produtivas, levando-os não somente às interações, mas principalmente ao reconhecimento social. Do contrário, quando não ocorre esta incorporação, as pessoas são desclassificadas, não reconhecidas social e moralmente em sua classe, levando a processos de exclusão e marginalização, sobretudo, em contextos de países de capitalismo periférico. E é exatamente o que ocorre com as pessoas com deficiência, pelas barreiras cotidianas de que são vítimas. Pela não incorporação do habitus em função das barreiras nas interações, os indivíduos com deficiência não adquirem conhecimentos úteis e, quando o fazem, não conseguem convertê-los em prática também por força das barreiras. É o que torna as pessoas com deficiência reféns de seus próprios corpos alijados de senso prático fundamental às interações que levam à participação social. Essas hipóteses teóricas, no entanto, necessitam de avaliações pormenorizadas e críticas e, principalmente, de análises empíricas capazes de elucidar seu alcance e limitações.
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Las opiniones, análisis y conclusiones del autor son de su responsabilidad y no necesariamente reflejan el pensamiento de la Revista Inclusiones. |
[1] Colin Barnes, Len Barton, y Mike Oliver, Disability Studies Today (Cambridge: Polity Press, 2002).
[2] Dan Goodley, Disability Studies: An Interdisciplinary Introduction (London: Sage, 2016).
[3] Anders Gustavsson, “The Role of Theory in Disability Research: Springboard or Strait-Jacket?” Scandinavian Journal of Disability Research 6, no. 1 (2004): 55–70, https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/15017410409512639.
[4] Tom Shakespeare, Disability Rights and Wrongs (New York: Routledge, 2006).
[5] Jessé Souza, A construção social da subcidadania: para uma sociologia política da modernidade periférica (Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2003).
[6] Jessé Souza, Subcidadania brasileira: para entender o país além do jeitinho brasileiro (Rio de Janeiro: LeYa, 2018).
[7] Wederson Santos, “Deficiência avaliada pela interação social: contribuições a partir de uma releitura de Erving Goffman,” Cahiers franco-latinoaméricains d’études sur le handicap 1 (2023), https://cfla-discapacidad.pergola-publications.fr/index.php?id=218.
[8] Carolina Ferrante, “Indagaciones sobre el vínculo entre política, moral y escolaridad en la perspectiva de Bourdieu,” Folios 41 (2015): 14, https://ri.conicet.gov.ar/handle/11336/51983.
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[11] Simo Vehmas y Nicholas Watson, “Moral Wrongs, Disadvantages, and Disability: A Critique of Critical Disability Studies,” Disability & Society 29, no. 4 (2014): 638–650, https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09687599.2013.831751.
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[18] David Le Breton, A sociologia do corpo, 2ª ed., traducido por Sônia M. S. Fuhrmann (Petrópolis: Vozes, 2007).
[19] Le Breton, A sociologia do corpo, 15.
[20] Len Barton e Mike Oliver, The Birth of Disability Studies (Leeds: The Disability Press, 1997).
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[31] Erving Goffman, Ritual de interação: ensaios sobre o comportamento face a face, traducido por Fábio Rodrigues Ribeiro da Silva (Petrópolis: Vozes, 2011).
[32] Carolina Ferrante, “La ‘discapacidad’ como estigma: una mirada social deshumanizante. Una lectura de su incorporación temprana en los Disability Studies y su vigencia actual para América Latina,” Revista Pasajes 10 (2020): 1–26, https://ri.conicet.gov.ar/handle/11336/170424.
[33] Jeffrey Brune, Rosemarie Garland-Thomson, Susan Schweik, Tanya Titchkosky, y Heather Love, “Forum Introduction: Reflections on the Fiftieth Anniversary of Erving Goffman’s Stigma,” Disability Studies Quarterly 34, no. 1 (2014), https://dsq-sds.org/index.php/dsq/article/view/4014
[34] Wederson Santos, “Deficiência avaliada pela interação social: contribuições a partir de uma releitura de Erving Goffman,” Cahiers franco-latinoaméricains d’études sur le handicap 1 (2023), https://cfla-discapacidad.pergola-publications.fr/index.php?id=218.
[35] Carolina Ferrante, “La ‘discapacidad’ como estigma: una mirada social deshumanizante. Una lectura de su incorporación temprana en los Disability Studies y su vigencia actual para América Latina,” Revista Pasajes 10 (2020): 1–26, https://ri.conicet.gov.ar/handle/11336/170424.
[36] Jeffrey Brune, Rosemarie Garland-Thomson, Susan Schweik, Tanya Titchkosky, y Heather Love, “Forum Introduction: Reflections on the Fiftieth Anniversary of Erving Goffman’s Stigma,” Disability Studies Quarterly 34, no. 1 (2014), https://dsq-sds.org/index.php/dsq/article/view/4014.
[37] Wederson Santos, “Deficiência avaliada pela interação social: contribuições a partir de uma releitura de Erving Goffman,” Cahiers franco-latinoaméricains d’études sur le handicap 1 (2023), https://cfla-discapacidad.pergola-publications.fr/index.php?id=218.
[38] David Le Breton, A sociologia do corpo, 2ª ed., traducido por Sônia M. S. Fuhrmann (Petrópolis: Vozes, 2007).
[39] Staffan Bengtsson, “Out of the Frame: Disability and the Body in the Writings of Karl Marx,” Scandinavian Journal of Disability Research 19, no. 2 (2017): 151–160, https://sjdr.se/articles/10.1080/15017419.2016.1263972.
[40] David Harvey, “O corpo como estratégia de acumulação,” en Espaços da esperança (Rio de Janeiro: Edições Loyola, 2004), 135–160.
[41] Le Breton, A sociologia do corpo, 16.
[42] Bengtsson, “Out of the Frame,” 154.
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[44] Colin Barnes, Len Barton, y Mike Oliver, Disability Studies Today (Cambridge: Polity Press, 2002)
[45] Debora Diniz, O que é deficiência (São Paulo: Brasiliense, 2007).
[46] Diniz, O que é deficiência.
[47] Barnes, Barton, y Oliver, Disability Studies Today.
[48] Michael Oliver, The Politics of Disablement (London: Macmillan, 1990), xiv.
[49] Tom Shakespeare, Disability Rights and Wrongs (New York: Routledge, 2006).
[50] Carol Thomas, “Disability Theory: Key Ideas, Issues, and Thinkers,” en Disability Studies Today, editado por Colin Barnes, Len Barton y Mike Oliver (Oxford: Blackwell Publishers Ltd, 2002), 38–57.
[51] Bill Hughes, “Disability and the Body,” en Disability Studies Today, editado por Colin Barnes, Len Barton y Mike Oliver (Cambridge: Polity Press, 2002), 58–76.
[52] Anders Gustavsson, “The Role of Theory in Disability Research: Springboard or Strait-Jacket?” Scandinavian Journal of Disability Research 6, no. 1 (2004): 55–70, https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/15017410409512639.
[53] Tom Shakespeare, Disability Rights and Wrongs (New York: Routledge, 2006), 65.
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[55] Tom Shakespeare, Disability Rights and Wrongs (New York: Routledge, 2006), 65.
[56] Ibid.
[57] Shakespeare, Disability Rights and Wrongs, 65.
[58] Debora Diniz, O que é deficiência (São Paulo: Brasiliense, 2007).
[59] Mairian Corker y Tom Shakespeare, eds., Disability/Postmodernity: Embodying Disability Theory (Lancashire: University Press, 2002).
[60] Shelley Tremain, ed., Foucault and the Government of Disability (Michigan: The University Press, 2015).
[61] Bill Hughes, “Disability and the Body,” en Disability Studies Today, editado por Colin Barnes, Len Barton y Mike Oliver (Cambridge: Polity Press, 2002), 58–76.
[62] Tom Shakespeare, Disability Rights and Wrongs (New York: Routledge, 2006).
[63] Susan Wendell, The Rejected Body: Feminist Philosophical Reflections on Disability (New York: Routledge, 1996).
[64] Margrit Shildrick, “Critical Disability Studies: Rethinking the Conventions for the Age of Postmodernity,” en Routledge Handbook of Disability Studies, editado por Nick Watson, Alan Roulstone y Carol Thomas (London: Routledge, 2012), 30–41.
[65] Abram Anders, “Foucault and ‘the Right to Life’: From Technologies of Normalization to Societies of Control,” Disability Studies Quarterly 33, no. 3 (2013), https://dsq-sds.org/index.php/dsq/article/view/3340/3268.
[66] Barnes, Barton, y Oliver, Disability Studies Today.
[67] Abram Anders, “Foucault and ‘the Right to Life’: From Technologies of Normalization to Societies of Control,” Disability Studies Quarterly 33, no. 3 (2013), https://dsq-sds.org/index.php/dsq/article/view/3340/3268.
[68] Mairian Corker y Tom Shakespeare, eds., Disability/Postmodernity: Embodying Disability Theory (Lancashire: University Press, 2002).
[69] Shelley Tremain, ed., Foucault and the Government of Disability (Ann Arbor: University of Michigan Press, 2005).
[70] Anders, “Foucault and ‘the Right to Life’,” 3.
[71] Anders, “Foucault and ‘the Right to Life’
[72] Judith Butler, “Sujeição, resistência, ressignificação: entre Freud e Foucault,” en A vida psíquica do poder: teorias da sujeição (Belo Horizonte: Autêntica, 2022), 89–112.
[73] Judith Butler, “Foucault e o paradoxo das inscrições corporais,” Revista Peri 13, no. 3 (2021): 234, https://ojs.sites.ufsc.br/index.php/peri/article/view/4909.
[74] Shelley Tremain, ed., Foucault and the Government of Disability (Ann Arbor: University of Michigan Press, 2005).
[75] Butler, “Sujeição, resistência, ressignificação,” 90.
[76] Anders, “Foucault and ‘the Right to Life’,” 3.
[77] Butler, “Foucault e o paradoxo das inscrições corporais,” 231.
[78] Butler, “Sujeição, resistência, ressignificação,” 99.
[79] Butler, “Sujeição, resistência, ressignificação,” 99.
[80] Kirstin Marie Bone, “Trapped behind the Glass: Crip Theory and Disability Identity,” Disability & Society 32, no. 9 (2017): 1297–1314, https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09687599.2017.1313722.
[81] Dan Goodley, Disability Studies: An Interdisciplinary Introduction (London: Sage, 2011).
[82] Margrit Shildrick, “Critical Disability Studies: Rethinking the Conventions for the Age of Postmodernity,” en Routledge Handbook of Disability Studies, editado por Nick Watson, Alan Roulstone y Carol Thomas (London: Routledge, 2012), 30–41.
[83] Robert McRuer, “Compulsory Able-Bodiedness and Queer/Disabled Existence,” em Disability Studies: Enabling the Humanities, editado por Sharon L. Snyder y Brenda Jo Brueggemann (2002), 89.
[84] F. Carniel, A. A. M. Dias, y A. J. Lacruz, “Estudos da deficiência na produção acadêmica: uma cartografia nas arenas do Norte-global,” Sociologias 25 (2023), https://seer.ufrgs.br/index.php/sociologias/article/view/122287.
[85] Kirstin Marie Bone, “Trapped behind the Glass: Crip Theory and Disability Identity,” Disability & Society 32, no. 9 (2017): 1297–1314, https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09687599.2017.1313722.
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[90] Simo Vehmas y Nicholas Watson, “Moral Wrongs, Disadvantages, and Disability: A Critique of Critical Disability Studies,” Disability & Society 29, no. 4 (2014): 638–650, https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09687599.2013.831751.
[91] Vehmas, “Ethical Analysis of the Concept of Disability,” 642.
[92] Bone, “Trapped behind the Glass,”.1309.
[93] Jenks, “Crip Theory and the Disabled Identity,” 46.
[94] Simo Vehmas y Nicholas Watson, “Moral Wrongs, Disadvantages, and Disability: A Critique of Critical Disability Studies,” Disability & Society 29, no. 4 (2013): 638–650, https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09687599.2013.831751.
[95] Souza, Como o racismo criou o Brasil, 53
[96] Para Taylor e Castro (2006), os povos indígenas das terras baixas da América do Sul concebem o corpo nunca se bastando a si mesmo, não como aquela matéria a ocupar um lugar único e estável no esquema do cosmos, não como um atributo essencial de uma dada classe de seres, já que sua forma é inteiramente relativa à perspectiva de um testemunho – humano ou não humano –, fornecido pelo olhar do outro, em constante incompletude. O corpo precisa ser considerado em sua relação necessária entre um observador e a função de sujeito, isto é, reciprocamente, já que nenhum sujeito pode ser concebido sem uma inscrição corporal determinada (2006, pág 769 e 770).
[97] Thiry-Cherques, “Pierre Bourdieu: a teoria na prática,” 31.
[98] Bourdieu, Coisas ditas, 26.
[99] Bourdieu, Coisas ditas, 23.
[100] Para Bourdieu, a hexis corporal diz respeito à motricidade, mas em uma perspectiva de relação ao aprendizado e internalização de um conjunto de maneiras de se relacionar com o próprio corpo. Isto é, como esquema postural que é, ao mesmo tempo, singular e sistemático, porque solidário de todo um sistema de objetos e carregado de uma massa de significações e de valores sociais, como maneiras socialmente localizadas e que possuem a capacidade de classificar o indivíduo na estrutura do grupo e, que, por sua vez, são percebidas como naturais. Mas, ainda que os esquemas possam ir da prática à prática sem passar pelo discurso e pela consciência, isso não significa que a aquisição do habitus pela hexis corporal se reduza a um aprendizado mecânico de tentativas e erros (Bourdieu, 2009, pág 121).
[101] Bourdieu, “Esboço de uma teoria da prática,” 73.
[102] Bourdieu, “Esboço de uma teoria da prática,” 58.
[103] Medeiros, “Habitus e corpo social,” 289.
[104] Thiry-Cherques, “Pierre Bourdieu: a teoria na prática,” 33.
[105] Bourdieu, O senso prático, 121.
[106] Bourdieu, “Esboço de uma teoria da prática,” 58.
[107] Bourdieu, O senso prático, 112.
[108] Harvey, “O corpo como estratégia de acumulação,” 137.
[109] Harvey, “O corpo como estratégia de acumulação,” 151.
[110] Harvey, “O corpo como estratégia de acumulação,” 137.
[111] Harvey, “O corpo como estratégia de acumulação,” 138.
[112] Harvey, “O corpo como estratégia de acumulação,” 138.
[113] Pierre Bourdieu, A distinção: Crítica social do julgamento (Porto Alegre: Zouk, 2007).
[114] Catherine Connell y Ashley Mears, “Bourdieu and the Body,” en The Oxford Handbook of Pierre Bourdieu, editado por Thomas Medvetz y Jeffrey J. Sallaz (Oxford: Oxford University Press, 2018), 561–576.
[115] Bronagh Byrne, “Dis-Equality: Exploring the Juxtaposition of Disability and Equality,” Social Inclusion Journal 6, no. 1 (2018), https://www.cogitatiopress.com/socialinclusion/article/view/1161.
[116] Claire Edwards y Rob Imrie, “Disability and Bodies as Bearers of Value,” Sociology 37, no. 2 (2003): 239–256, https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0038038503037002002.
[117] Carolina Ferrante, “Corporalidad y temporalidad: fundamentos fenomenológicos de la teoría práctica de Pierre Bourdieu,” Nômadas. Critical Journal of Social and Juridical Sciences 20, no. 4 (2008): 173–181, https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=18102012.
[118] Carolina Ferrante y Juan Dukuen, “Discapacidad y opresión: una crítica desde la teoría de la dominación de Bourdieu,” Revista de Ciencias Sociales 30 (2017): 151–168, https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=453649665008.
[119] Ferrante, “Corporalidad y temporalidad,”.
[120] Souza, Como o racismo criou o Brasil, 191.
[121] Georg Lukács, Ontologia do ser social (São Paulo: Ciências Humanas, 1979)
[122] Ricardo Antunes, Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho (São Paulo: Boitempo, 1999), 140.
[123] Antunes, Os sentidos do trabalho, 140.
[124] Lukács, Ontologia do ser social.
[125] Antunes, Os sentidos do trabalho, 140.
[126] Um exemplo do habitus que altera o corpo é o caso dos bajaus, chamados “nômades do mar” que vivem há mais de um milênio da pesca por mergulho nas águas oceânicas das Filipinas, Malásia e Indonésia. Os bajaus levam o mergulho livre ao extremo, permanecendo submersos por até treze minutos a profundidades de cerca de sessenta metros (Guibbens, 2018). Um estudo publicado em 2018 revelou que uma mutação de DNA gerando o aumento do baço fornece aos bajaus uma vantagem genética para mergulharem em grandes profundidades por tanto tempo, resultado da seleção natural operada há mais de mil anos de prática dessa atividade laboral desses exímios pescadores (Llardo et al, 2018).
[127] Bourdieu, Coisas ditas, 23.
[128] Thiry-Cherques, “Pierre Bourdieu: a teoria na prática,” 33.
[129] Thiry-Cherques, “Pierre Bourdieu: a teoria na prática,” 67,68.
[130] Jessé Souza, Como o racismo criou o Brasil (Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2021).
[131] Souza, Como o racismo criou o Brasil, 15.
[132] Souza, Como o racismo criou o Brasil, 25.
[133] Taylor, Argumentos Filosóficos, 28.
[134] Souza, A construção social da subcidadania, 38.
[135] Bourdieu, O senso prático, 61.
[136] Souza, A construção social da subcidadania, 71.
[137] Souza, A construção social da subcidadania, 85.
[138] Souza, A construção social da subcidadania, 130.
[139] Souza, A construção social da subcidadania, 165–166.
[140] Bourdieu, Coisas ditas, 24.