El derecho de los pueblos tradicionales a la tierra: un estudio de caso del uso de la tierra de pastoreo en el área de Abyei-Sudán como contribución al debate brasileño sobre las tierras indígenas.

Direito à terra dos povos tradicionais: Uma análise do caso do uso de terras de pastoreio na área de Abyei-Sudão como contribuição ao debate brasileiro sobre as terras indígenas.

Traditional people's right to the land: An analysis of the use of pastelands in the Abyei-Sudan area as a contribution to the brazilian debate about indigenous lands.

Henrique Furtado Tavares
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
henriqueftavaresadv@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-7055-7133

Fecha de Recepción: 12 de Abril de 2023
Fecha de Aceptación: 09 de junio de 2023
Fecha de Publicación: 14 de septiembre 2023


RESUMEN:

El artículo estudia la visión de la Corte Permanente de Arbitraje en relación con los derechos tradicionales y la tenencia de la tierra de los pueblos indígenas en el derecho internacional público. Se circunscribe al caso GOS-SPLM/A, donde aborda la posición de la Corte sobre la cuestión del derecho tradicional y los plazos, lo que podría contribuir al debate sobre la demarcación de tierras indígenas en Brasil. La base metodológica es deductiva y dogmática en el campo de la eficacia de la norma. Objetivo descriptivo y teórico, técnica bibliográfica y documental. Concluye que los derechos tradicionales no pueden ser limitados a un tiempo determinado so pena de vulnerar los derechos culturales de esta población y que la CPA sería una instancia para evaluar posibles vulneraciones de estos derechos. Busca sumar al debate del país, ante el intento de aprobación del PL 490/2007 en trámite en el congreso nacional.


PALABRAS CLAVE.
 Derechos fundamentales; derechos tradicionales; Corte Permanente de Arbitraje; Gente indígena; Gente India.

RESUMO:

O artigo estuda a visão da Corte Permanente de Arbitragem em relação aos direitos tradicionais e posse de terra dos povos originários no âmbito do direito internacional público. Delimita-se ao caso GOS-SPLM/A onde aborda o posicionamento da Corte sobre a questão de direito tradicional e marcos temporais, o que poderia contribuir para o debate da demarcação de terras indígenas no Brasil. A base metodológica é dedutiva e dogmática no campo da eficácia da norma. Objetivo descritivo e teórico, técnica bibliográfica e documental. Conclui que os direitos tradicionais não podem ser limitados a determinado marco temporal sob pena de violação dos direitos culturais dessa população e que seria a CPA uma instância para apreciação de possíveis violações desses direitos. Busca acrescentar ao debate pátrio, ante a tentativa de aprovação da PL 490/2007 em trâmite no congresso nacional.

PALAVRAS-CHAVE. Direitos Fundamentais; Direitos Tradicionais; Corte Permanente de Arbitragem; Povos Originários; Povos Indígenas.

ABSTRACT

The article studies the view of the Permanent Court of Arbitration in relation to the traditional rights and land tenure of indigenous peoples under public international law. It is limited to the GOS-SPLM/A case, where it addresses the Court's position on the issue of traditional law and time frames, which could contribute to the debate on the demarcation of indigenous lands in Brazil. The methodological basis is deductive and dogmatic in the field of the effectiveness of the norm. Descriptive and theoretical objective, bibliographical and documental technique. It concludes that traditional rights cannot be limited to a certain time frame under penalty of violating the cultural rights of this population and that the CPA would be an instance for assessing possible violations of these rights. It seeks to add to the country's debate, in view of the attempt to approve PL 490/2007 in progress in the national congress.


KEY WORDS.
 Fundamental rights; Traditional Rights; Permanent Court of Arbitration; Indigenous Peoples; Indian people.

INTRODUÇÃO.

O projeto de pesquisa tem como objetivo analisar os fundamentos do caso GOS-SPLM/A (Governo do Sudão contra Movimento/Exército para a liberação do povo do Sudão), julgado final em 22 de julho de 2009 pela Corte Permanente de Arbitragem como contribuição para a discussão da questão das terras indígenas no Brasil, em especial o projeto de lei nº PL n. 490/2007, que pretende impor o marco temporal além de outras restrições em relação às demarcações.

Destaca-se que a posse, bem como os direitos culturais dos povos tradicionais são direitos sociais e, portanto, guardam relação direta com o tema anual do Núcleo de Estudos em Tribunais Internacionais. Ademais, a contribuição das discussões no âmbito do direito internacional no direito interno estão dentro da visão sistêmica do direito internacional.

A respeito do caso, o ano de 2004, o Governo do Sudão[1] e Movimento/Exército para a liberação do povo do Sudão[2] firmaram acordo através do Protocolo de Abyei[3], segundo o qual território (da Área de Abyei) é definido como a área das nove chefias Ngok Dinka transferidas para o Kordofan em 1905[4][5].

Kordofan é a Província ocidental do Sudão na fronteira com Darfur[6] no oeste, Bahr el Ghazal[7] no sudoeste e Alto Nilo[8] no sudeste, enquanto as Dinkas são tribos de origem nilóticas que incluem os Ngok, Rueng e Twic e, para o estudo de caso, elenca como termo utilizado no caso julgado as nove chefias Ngok Dinka, compostas pelas tribos dos Abyior, Achaak, Achueng, Alei, Anyiel, Bongo, Diil, Manyuar e Mareng.

Os Ngok Dinka, uma das vinte e cinco tribos que compõe a população Dinka, vivem da subsistência do cultivo da terra, possuem uma conexão espiritual com a terra de seus ancestrais e através de sua lei tribal permitem que indivíduos e famílias usem certas áreas.

Ao norte dos Ngok Dinka vivem os Misseriya, tribo árabe composta por pastores de gado, cuja existência nômade os leva para um amplo território, que vai desde a área ao redor de Muglad ao norte, onde passam grande parte de cada ano, até o sistema do rio Bahr da região de Abyei durante partes da estação seca.

A controvérsia que baseou o julgado supramencionado se fundamenta no fato de a discordância do Governo do Sudão com o relatório apresentado pelos especialistas da Comissão de Fronteiras de Abyei, nas áreas delimitadas e na aplicação da “Fórmula”[9] e os consequentes resultados que o relatório em comento produziu.

Tal relatório concluiu que as tribos do Ngok Dinka e a tribo árabe nômade intitulada Misseriya[10] possuem direitos tradicionais relativos a terra por sua presença no local antes e após a transferência para o Kordofan em 1905, assim como pelos direitos secundários para pastoreio, o que gerou a insatisfação do Governo do Sudão, em especial a um suposto excesso de competência da Comissão para delimitação das fronteiras em questão, que deveria se ater a delimitar a área das nove chefias e não em questões como direitos secundários de pastoreio.

Um ponto importante a ser ressaltado é que o relatório da Comissão de Fronteiras de Abyei se baseou, além dos mapas e provas documentais, em provas orais e testemunhais que foram de suma importância para a decisão final da corte.

Outro ponto é que houve uma análise pela Corte de casos análogos de outros tribunais, além de casos da própria CPA e através do entendimento acerca dos direitos tradicionais e princípios do Direito Internacional Público, colecionaram entendimento sobre o que fora chamado de “Interpretação tribal predominante da fórmula como razoável à luz dos fatos históricos de 1905”.

Nesse sentido, pretende-se compreender os fundamentos utilizados no julgado e, em que medida eles podem contribuir com a discussão interna sobre proposta pelo projeto de Lei PL n. 490/2007 que trata do marco temporal de demarcação e prevê que só poderão ser consideradas terras indígenas aquelas que já estavam em posse desses povos na data da promulgação da Constituição, 05 de outubro de 1988, passando a exigir, dessa forma, uma comprovação de posse.

A Corte Permanente de Arbitragem foi criada em 29 de julho de 1899 em Haia na 1ª Conferência da Paz e possui como objetivo a solução pacífica de litígios internacionais que não puderam ser resolvidos por vias diplomáticas. O Brasil, apesar de não participar da conferência de 1899 aderiu na totalidade às suas deliberações, vindo a ser devidamente promulgada, a convenção de 1907, pelo Decreto n. 10.719 de 04 de fevereiro de 1914.

Cumpre ressaltar que a Corte Permanente de Arbitragem trata de desentendimento internacionais de ordem jurídica e não política, possuindo competência consultiva e contenciosa e com base em seu objetivo inicial, possuem a função de conciliar, inquirir (através de comissões internacionais que atuarão na investigação imparcial de fatos) e arbitrar litígios internacionais.

Na busca pela jurisdição da corte, poderão ofertar casos de disputa internacionais, quaisquer dois ou mais estados, um Estado e uma organização internacional, duas ou mais organizações internacionais, ou até mesmo um Estado contra uma entidade privada ou por fim, uma organização internacional e uma entidade privada.

No caso em comento trata-se de um Estado contra o grupo de liberação que em 11 de julho de 2008 depositaram o acordo de arbitragem na Secretaria Geral da Corte Permanente de Arbitragem lhe apontando como autoridade competente para os procedimentos legais em comento.

Buscará a delimitação da pesquisa no conhecimento e entendimento já proferido em sede da disputa entre o Governo do Sudão e o do Movimento/Exército para a liberação do povo do Sudão pela Corte Permanente de Arbitragem, bem como de casos anteriores da corte, tais como, caso Eritrea-Yemen[11] na determinação de reivindicações de soberania territorial sobre as ilhas do Mar Vermelho e a delimitação da fronteira marítima entre a Eritreia e o Iémen, onde a Corte Permanente de Arbitragem decidiu pela res communis, permitindo que pescadores africanos e iemenitas pudessem pescar sem limitações importes pelo tribunal.

Além dos casos Reino Unido v. Irã (Petróleo Anglo Iraniano Co.)[12], caso do Saara Ocidental[13], direito de passagem reconhecido a Portugal sobre o território Indiano que anteriormente pertencia ao Estado Português[14] e do caso de delimitação de zona de pesca entre a Dinamarca e Noruega[15], todos da Corte Internacional de Justiça, como sistematização do entendimento corroborado pela Corte de Arbitragem.

No que diz respeito a situação brasileira, trará uma análise à discussão pátria das demarcações de terras indígenas, em especial em relação ao marco temporal, que segundo o Projeto de Lei n. 490/2007 que segue em julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, por necessariamente tratar de matéria legislativa que possa vir a infringir norma constitucional, deve ser contado apenas demarcações anteriores a promulgação da Carta Magna de 1988.

Ressalta-se que em voto datado de 09 de setembro de 2021, o relator, Ministro Edson Fachin sinalizou pelo entendimento de que os direitos das comunidades indígenas são direitos fundamentais e que não podem ser necessariamente tratados como direito privado de posse, por não possuir para esses povos tradicionais, quaisquer valores comerciais e sim, tradicional e até mesmo espiritual, de identidade e de existência.

Tal entendimento é corroborado tanto pelo caso julgado pela Corte de Arbitragem n. GOS-SPLM/A (Governo do Sudão contra Movimento/Exército para a liberação do povo do Sudão), quanto pela constituição, que em seu art. 231 menciona os direitos originários dos povos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam, assim como seu §2º que lhes confere posse permanente das terras supramencionadas.

Reitera-se que o Brasil é signatário de tratados internacionais, já ratificados, tais como o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais[16] e Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1993[17], além da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José de Costa Rica)[18] e Carta das Nações Unidas de 1945[19] e ratificada em 1948.

No âmbito acadêmico irá contrapor tópico específico da jurisdição e competência consultiva e contenciosa da Corte Permanente de Arbitragem no julgado em específico com a doutrina do Professor Wagner Menezes.

Assim como, com base na doutrina pátria, buscará análise de questões dos direitos tradicionais e originários dos povos indígenas nos artigos da autora de tese de dissertação de mestrado da Universidade de Brasília, da professora Samara Carvalho, que versou especificamente sobre os argumentos do Supremo Tribunal Federal, os impactos dessa análise da demarcação das terras e judicialização da questão territorial indígena.

Na questão de demarcação e segurança jurídica, abordará o artigo das professoras Daize Fernanda e Aline Suzana e por fim, sobre o cenário atual da demarcação de terras no Brasil sobre a ótica do professor Alexandre Assis Tomporoski.

O estudo se justifica na relevância do entendimento internacional acerca de direitos tradicionais dos povos, em especial acerca de direitos relativos a sua cultura pregressa, sua religião, seus costumes e direitos culturais em geral.

Neste ponto, buscar-se-á uma análise intrínseca acerca do posicionamento da Corte Permanente de Arbitragem na validação de relatórios de especialistas apontados para realizar possíveis questões de delimitação e demarcação de terras[20], como também a contribuição da corte em relação a interpretação sistêmica do direito tradicional dos povos em direito internacional.

A hipótese desta pesquisa é a de que, assim como trazido no julgado, o direito à posse dos povos tradicionais, os indígenas no Brasil, não podem ser limitados a determinado marco temporal, sob pena de violação dos direitos culturais dessa população.

 

  1. CASO GOS-SPLM/A. A VISÃO SISTÊMICA DA CORTE PERMANENTE DE ARBITRAGEM ACERCA DOS DIREITOS TRADICIONAIS DE POSSE DE TERRA DE POVOS ORIGINÁRIOS.

A locução povos originários, em simplista denominação nada mais é do que a denominação dos nativos, população nascida e proveniente de um local determinado ao qual sua cultura se vincula umbilicalmente e ancestralmente a esse lugar.

A grosso modo, trata-se de local onde uma população vincula seu domínio, gnose, consciência, compreensão e autodeterminação à ancestralidade de seu povo, quer seja pela posse, quer seja pelas tradições relacionadas à essa localização, como no caso do presente estudo, áreas de pastoreio, de migração durante determinadas temporadas climáticas e até mesmo sazonalidades especificas relativas às suas tradições e costumes.

A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos das Populações Indígenas de 13 de Setembro de 2007, menciona em seu preâmbulo (UNGA, 2007)[21] a importância do reconhecimento e respeito tanto às suas tradições espirituais, cultura história e concepção de vida[22], quanto ao direito “intrínseco” desses povos à terra, recursos e territórios[23]:

“Convencida de que o controle, pelos povos indígenas, dos acontecimentos que os afetam e as suas terras, territórios e recursos lhes permitirá manter e reforçar suas instituições, culturas e tradições e promover seu desenvolvimento de acordo com suas aspirações e necessidades”

A supracitada Declaração elenca diversos direitos inerentes à população indígena, a expressão ora mencionada, “intrínseca”, remete a denominação para os direitos tradicionais desses povos originários.

Cumpre atenção redobrada nos dispositivos mencionados à Declaração que delimitamos especificamente aos direitos tradicionais à cultura e autodeterminação, nos termos do artigo terceiro que menciona, “Artigo 3. Os povos indígenas têm direito à autodeterminação. Em virtude desse direito determinam livremente sua condição política e buscam livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural.” (UNGA, 2007)[24] reforçado novamente em seu artigo quinto ao reiterar o direito dos povos indígenas na preservação de suas próprias instituições políticas, jurídicas, econômicas, sociais e principalmente, culturais de modo a reforçá-las e mantê-las vivas às futuras gerações.

O Conselho Federal de Serviço Social. Gestão Tempo de Luta e Resistência em manifesto publicado no dia da luta indígena, menciona:

“As reivindicações indígenas foram contempladas em grande parte na Constituição brasileira de 1988, concentradas no Capítulo VII, artigos 231 e 232. Legalmente, os/as índios/as são reconhecidos/as no seu modo de vida, quanto às suas formas de organização, costumes, línguas, crenças e tradições, e são assegurados os direitos originários sobre as terras tradicionalmente ocupadas por eles/as. Rompeu-se a perspectiva da integração desses povos à sociedade nacional. ” (CFESS, 2012)[25]

 Os costumes e tradições originais dos povos indígenas são contemplados de forma tácita na declaração das Nações Unidas aprovada pelo Brasil em março de 2008, no Rio de Janeiro, bem como na própria Carta Magna.

Em relação às “terras tradicionalmente ocupadas” por essa população, cabe mencionar o disposto no artigo décimo que traz proibição ao Estado de remoção à força de suas terras e territórios[26], reforçando objetivamente à posse e direito à propriedade e gozo desses povos às terras que se vinculam às suas origens.

Anterior ao artigo supramencionado, verifica-se preocupação dos legisladores e Estados Signatários em relação à destruição da cultura ou assimilação forçada a outras culturas, além da prevenção por parte dos Estados em atos desse, ou de terceiros, na subtração de terras, territórios e recurso (UNGA, 2007)[27].

Dito isso, o presente tópico abordará as questões de direito internacional público sobre o tema especificamente em relação à jurisprudência da Corte Permanente de Arbitragem, caso julgado e publicado no ano de 2009, 22 de julho, na cidade de Haia, na Holanda, caso n. GOS-SPLM/A (Governo do Sudão contra Movimento/Exército para a liberação do povo do Sudão), onde a corte de arbitragem tratou de litigio acerca do relatório apresentado pelos especialistas da Comissão de Fronteiras de Abyei, que concluiu que as tribos do Ngok Dinka e a tribo árabe nômade intitulada Misseriya[28] possuem direitos tradicionais relativos a terra por sua presença no local antes e após a transferência para o Kordofan em 1905, assim como pelos direitos secundários para pastoreio, em detrimento ao entendimento do Governo do Sudão.

O presente estudo visa demonstrar a visão sistêmica da Corte acerca dos direitos tradicionais dos povos originários a partir do julgamento do caso envolvendo às tribos sudanesas e posteriormente, traçar a simetria do caso com a situação que a população indígena brasileira se encontra envolvida na atualidade.

Para tanto trará a partir desse momento alguns entendimentos da corte em relação à questão probatória de demarcação das terras, das questões de marcos temporais utilizados no julgado internacional em comento e principalmente o peso considerado na decisão que fora levado em conta em relação aos princípios da autodeterminação dos povos, direitos tradicionais à posse, território e recursos dos povos originários.

  1. DA PRODUÇÃO DE PROVAS HISTÓRICAS E TESTEMUNHAIS.

Em tópico futuro, abordaremos situação de denúncia contra o Governo do Sudão, onde fora mencionado alegações e incitação por parte do Estado Sudanês ao um motim da tribo dos Misseriya contra a Corte de Arbitragem.

Conforme artigo 8.3. (i) do acordo de arbitragem homologado, as partes preencheriam e apresentariam memoriais escritos com anexos de conteúdo probatório tais como, testemunhos, relatórios de especialistas, mapas evidencias históricas e documentais que pudessem corroborar sua versão.

Apenas a título de conhecimento e para demonstrar a complexidade do caso, do envolvimento de interesse e da importância da decisão (também de alta complexidade) da Corte de Arbitragem, mister se pronunciar sobre a denúncia datada de 30 de março de 2009, em carta endereçada à corte contra o Governo do Sudão, informando que uma das testemunhas dos Ngok Dinka fora ameaçada de morte (PCA, 2009, p. 16).[29]

Não entraremos em detalhes acerca da denúncia ou das consequências decorrentes da mesma, porém cumpre ressaltar a importância do tema, haja vista que parte do decisório acerca da decisão da Corte se baseou nos depoimentos testemunhais, o que logicamente infere nos interesses escusos em se ameaçar testemunhas.

Além das provas documentais, dos relatórios produzidos pelos especialistas em fronteiras do Abey, o tribunal se baseou também em provas orais e testemunhais produzidas. Tal situação geralmente é verificada em questões históricas de demarcações de terras indígenas e povos originários, até mesmo no Brasil.

Se faz logicamente necessárias as questões históricas e relatos de membros de tais tribos originárias afim de se entender a extensão e delimitação do que esses povos entendem ser parte de sua ancestralidade e logicamente, tal visão e testemunho deve ser levado em conta por quem mais entende da região, os próprios moradores e descendentes que ali encontram vínculo espiritual e ancestral com a terra.

O governo do Sudão tentou repetidas vezes desqualificar os testemunhos ao mencionar ser impossível se referir a eventos passados aos quais as testemunhas ali citadas sequer podem atestar pessoalmente[30].

A posteriori o Governo do Sudão contestou temporalidade dos relatos alegando que se tratavam de momento posterior (aproximadamente ano de 1940) ao marco temporal ali debatido (ano de 1905) e até mesmo considerou como terceiro argumento para desclassificar os testemunhos o fato de que os relatos ali elencados eram muito vagos para se atingir uma visão objetiva dos territórios considerados como área de Abey em 1905.

Em conclusões preliminares acerca do conteúdo probatório, especificamente relativo aos testemunhos, o Tribunal concordou que esses se baseiam em informações repassadas por gerações, porém concluiu que trata-se de fonte importante de evidência para o mérito do caso[31], “Quando se trata de definir a área histórica de uma tribo, um exercício inerentemente difícil, é razoável, e de fato bastante lógico, buscar informações dos próprios membros da tribo”, concluiu o relator.

A mera assumpção de que a voz dos membros das tribos não teriam validade probatória por “se tratar de argumentos vagos” ou ainda, “versar sobre fatos passados” é ilógica haja vista que a parte que rebate tais conteúdos de prova testemunhal sequer viveu a história da tribo na região e também se baseiam nos relatórios históricos produzidos pelos especialistas das fronteiras de Abey, relatórios esses que corroboram a versão testemunhal.

O tribunal de maneira assertiva apenas explicitou o óbvio, ninguém melhor para falar de suas terras dos que os membros das tribos que ali vivem. Tal situação em muito pode acrescentar ao debate pátrio de marco temporal e demarcação de terras no Brasil e a jurisprudência internacional entende de forma tácita pela validade e força do conteúdo probatório das testemunhas, o que pode ser utilizado futuramente como forma de recurso em casos de injustiças institucionais.

Em parte final do julgado sobre o tema histórico e de contéudo probatório testemunhal o tribunal menciona jurisprudência anterior que aqui elencamos:

“Não obstante os desafios criados pelo uso de histórias orais como prova de fatos históricos, as leis da evidência devem ser adaptadas para que esse tipo de evidência podem ser acomodados e colocados em pé de igualdade com os tipos de provas com as quais os tribunais estão familiarizados, que consiste em grande parte em documentos históricos. Esta é uma prática de longa data na interpretação de tratados entre a Coroa e povos aborígenes “ (PCA, 2009, Op. Cit., p. 248).[32]

Em conclusão final a Corte Permanente de Arbitragem admitiu a evidência e testemunho oral em suas devidas instâncias, com valor probatório própria para cada situação e devidamente corroboradas por questões e conteúdos históricos, o que possui grande valia como base de argumentação para outras situações vindouras além do debate atual acerca do marco temporal brasileiro.

  1.  DA VISÃO DO TRIBUNAL INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS TRADICIONAIS DOS NGOK DINKA.

O tribunal a priori menciona sobre a expectativa das partes na resolução final do conlito litigioso em relação à área de Abey e todas as consequências relevantes e decorrentes de tal decisão (PCA, op. Cit., 2009).

Porém, como bem ressaltou o julgado final, o artigo terceiro alínea “c”[33] das regras do Tribunal de Arbitragem[34], válidas a partir de 17 de dezembro de 2012, menciona que a arbitragem deverá incluir a identificação da arbitragem que fora ao tribunal invocada. No caso em tela, o foco fora a delimitação “no mapa” das fronteiras da área de Abey (PCA, 2009).

Assim reitera o Tribunal de Arbitragem que sua atenção aos limites territoriais não devem “implicar que as Partes têm o direito de desconsiderar outras relações territoriais que as pessoas que vivem dentro e nas proximidades da área de Abey que tem se mantido historicamente.” (PCA, op. Cit., 2009, p. 259).

Nesse sentido, verifica-se que o tribunal delimita sua função de arbitragem ao pedido em si, que seria a análise acerca das fronteiras consideradas pelo relatório emitido pelos especialistas em fronteiras “no mapa” e não as consequências que tal decisão teria em relação Às pessoas, aos costumes e consequentemente aos direitos tradicionais daqueles povos.

Como jurisprudência, utilizou o caso da Corte Internacional de Justiça relativo ao conflito no Saara Ocidental, que será melhor exemplificado no futuro do presente estudo e finaliza o tópico corroborando o entendimento da Corte Internacional que concluiu à época que existem outras amarras que não se delimitam à fronteiras ao se tratar de territórios em comum que são vitais para a devida manutenção da própria vida em determinada região (2009, p. 259, apud. ICJ, 1975, p. 12,65).

A corte Permanente de Arbitragem menciona que a limitação da competência do mesmo para questões que suplantem necessariamente direitos tradicionais aplicáveis Às fronteiras da área de Abey, nos exatos termos dos princípios e vedações relativas aos mesmos, impostas nas Declarações e Convenções internacionais, finalizando ao mencionar que o tribunal deve ressaltar a decisão dos especialistas da ABC, que em sua declaração final mencionou que “Os Ngok e Misseriya devem manter seus direitos secundários estabelecidos para o uso da terra ao norte e ao sul desta fronteira” (2009, p. 259, apud., ABC Experts’ Report, Part I, p. 22).

Em conclusão ao presente tópico verifica-se que o tribunal não pode e não deve extrapolar suas funções na conclusão da arbitragem formulada em relação aos seus limites de competência (se atendo À requisição protocolada À corte) e não extrapola os limites estabelecidos em princípios de direito internacional público, no caso em tela, dos direitos tradicionais, costumes, recursos, direito à terra e posse dos povos originários daquela região.

  1. DOS DIREITOS DE PASTOREIO E OUTROS DIREITOS TRADICIONAIS RELATIVOS AOS RECURSOS PERTENCENTES AOS POVOS ORIGINAIS.

Em relação aos direitos tradicionais de pastoreio da tribo dos Misseriya e outras tribos nômades da região, que fazem de tal prática essencial para sua subsistência durante épocas de chuvas, enchentes e de pasto fértil, sua principal fonte de subsistência, a Corte de Arbitragem entendeu que houve preocupação necessária do Protocolo de Abey especificamente em proteger tais direitos de pastoreio, garantindo ao povo Misseriya a garantia e prerrogativa de manutenção dos direitos tradicionais de pastoreio de gado e de travessia da região do Abey (PCA, op. Cit., 2009, p. 260)[35].

  1. DO FUNDAMENTO DOS PRINCIPIOS GERAIS DE DIREITO INTERNACIONAL SOBRE A NÃO EXTINÇÃO DE DIREITOS TRADICIONAIS MEDIANTE DELIMITAÇÕES TERRITORIAIS.

Neste tópico do julgado, apontam os juízes da Corte Permanente de Arbitragem que a jurisprudência internacional dos Tribunais corroboram o entendimento anterior, ou seja, o princípio de que na ausência de norma explícita ou proibição tácita em contrário, a transferência de soberania no contexto global de delimitação de fronteiras e território entre as partes não pode ser levada em conta ou construída de forma a extinguir necessariamente os direitos tradicionais anteriores de posse, uso e gozo de terras e recursos (PCA, op. Cit., 2009, p. 260).

Na visão do governo do Sudão, os especialistas extrapolaram suas competências em seu relatório ao conceder tais prerrogativas, que a bem da verdade, tratam-se de direitos tradicionais anteriores e já praticados pelas tribos a tempos e conforme bem mencionado pelo Professor Richard Muko da Universidade Saint Augustine da Tanzania, houve relatos e até mesmo acusações que recaíram sobre o Governo do Sudão de incitar o povo Misseriya contra a Corte Permanente de Arbitragem e o protocolo de Abey, informando falsamente que “A implementação total do protocolo negaria a Misserriya seus direitos de pastagem e residência sobre Abyei” (OCHANDA, 2015).

A grave acusação possui fundamento, pois segundo os professores, o histórico da região é marcado necessariamente por interesses políticos e geográficos, haja vista a existência de petróleo, que culminou em um conflito que já data aproximadamente cinquenta anos.

“Abyei é uma região rica em petróleo situada ao longo das fronteiras do Sudão e do Sudão do Sul. A área de Abyei cobre 4.000 milhas quadradas de deserto, terras agrícolas e campos de petróleo localizados ao longo da fronteira mal definida entre o Sudão e o Sudão do Sul. Abyei é reivindicada por ambos os países e tem sido uma fonte de conflito no Sudão há mais de 50 anos.“ (OCHANDA, op. Cit., p. 2)[36].

Além dos princípios de direito internacional público elencados no julgamento final dos juízes da Corte de Arbitragem, a decisão se valeu também nas jurisprudências sobre o tema em diversos tribunais internacionais. No tópico a seguir elencaremos de forma breve e sucinta julgados anteriores da Corte Permanente de Arbitragem bem como, julgados de casos análogos em tribunais diversos, em especial da Corte Internacional de Justiça.

  1. DA JURISPRUDÊNCIA ANTERIOR DA CPA E COMPARATIVO À CASOS ANÁLOGOS DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA.

Ben Cousins e Aninka Claassens mencionam que a maioria dos sistemas territoriais na África ainda possuem caráter “comum” em relação às pessoas, povos e tribos que os utilizam:

“O caráter geral da posse comum é que os direitos à terra e aos recursos naturais são compartilhados e relativos, com fronteiras flexíveis entre uma variedade de unidades sociais, mas não obstante, conferindo altos níveis de segurança de posse. Os direitos relativos estão aninhados dentro de uma hierarquia de direitos sociais e unidades ou níveis administrativos.“ (COUSINS, CLAASSENS, 2004).

A doutrina internacional é majoritária acerca dos direitos tradicionais de povos originários e a jurisprudência internacional coleciona casos que vão além de apenas uso de terra ou casos específicos como pastoreio, se estendendo até mesmo para pesca e utilização dos recursos do mar.

O tópico a seguir fará menção sobre um julgado anterior da Corte Permanente de Arbitragem que segue a entonação do julgamento final do caso Sudanês, além de breves pontuações sobre julgamentos em tribunais diversos, no caso, a Corte Internacional de Justiça.

Ressalta o autor que fará apenas um breve resumo do caso e da decisão, sendo essa apenas e tão somente em relação aos direitos tradicionais, haja vista que qualquer intenção de adentrar no mérito total do julgado poderia ferir a delimitação do presente estudo além de estender por demais o artigo.

  1.  CASO ERITREIA/IÊMEN - SOBERANIA E DELIMITAÇÃO MARÍTIMA NO MAR VERMELHO. CORTE PERMANENTE DE ARBITRAGEM. 1998.

Trata-se de acordo pacífico para arbitragem perante tribunais competentes datado de 03 de outubro de 1996 entre o Governo da Eritrea e o Governo da República do Yemen (PCA, 1998), acerca da soberania e delimitação do mar vermelho submetida à Corte Permanente de Arbitragem.

Em breve suma, o tribunal delimitou a territorialidade de cada Estado e por fim, na alínea “vi”, do capítulo XI, tópico 527 do dispositivo final decisório, mencionou “vi. A soberania encontrada no Iêmen implica a perpetuação da regime de pesca tradicional na região, incluindo livre acesso e diversão para os pescadores da Eritreia e do Iémen.” (PCA, 1998, p. 148)[37].

  1. CASO DINAMARCA/NORUEGA. DELIMITAÇÃO MARÍTIMA NA ÁREA ENTRE A GROENLÂNDIA E JAN MAYEN.

O caso acima mencionado fora proposto para elucidação do litigio envolvendo os Estados da Dinamarca e Noruega sobre a delimitação das zonas de pesca entre a costa da Groelândia e da ilha norueguesa de Jan Mayen.

A corte Permanente de Arbitragem menciona esse julgado em sua página 261 ao citar trechos do julgado da Corte Internacional de Justiça que reiterou

“se qualquer mudança ou o ajuste da linha mediana como limite da zona de pesca seria necessário para garantir o acesso equitativo ao bacalhau e recursos pesqueiros para as comunidades pesqueiras vulneráveis ​​em questão”. (PCA, 2009, apud. ICJ, Reports 1993. p. 38, paras. 72-78).

A Corte Internacional de Justiça menciona sobre a sazonalidade anual da pesca e a importância para sobrevivência da comunidade pesqueira de ambos os Estados na distribuição equitativa das áreas de pesca do bacalhau:

“76. Parece ao Tribunal que a migração sazonal do bacalhau apresenta um padrão que, ao norte da linha de 200 milhas reivindicada pela Islândia, pode-se dizer que se concentra na parte sul da área de sobreposição alegações, aproximadamente entre aquela linha e o paralelo de 72" de latitude Norte, e que a delimitação da zona de pesca deve reflectir este facto. É claro que nenhuma delimitação na área poderia garantir a cada Parte a presença em todos os anos de quantidades pescáveis ​​de capelim na zona atribuída a ele pela linha. No entanto, parece ao Tribunal que a linha mediana é demasiado muito a oeste para a Dinamarca ter a garantia de um acesso equitativo ao estoque de bacalhau, uma vez que atribuiria à Noruega a totalidade da área de reivindicações sobrepostas. Por esta razão também a linha mediana requer que ser ajustado ou deslocado para leste. ” (ICJ, 1993. p. 38)[38].

        

  1.  CASO PORTUGAL/ÍNDIA. DIREITO DE PASSAGEM SOBRE O TERRITÓRIO INDIANO.

No caso português, proposto em desfavor ao Estado Indiano acerca do direito de passagem com julgamento datado de 26 de novembro de 1957, a Corte Internacional de Justiça entendeu que é um princípio já previamente estabelecido e majoritário na jurisprudência e doutrina internacional, que a transferência de soberania territorial, decorrente de novas delimitações de fronteira não podem extinguir direitos tradicionais.

Neste diapasão, considerou-se o direito de passagem português para territórios de sua competência na Índia, invocando institutos bastante conhecidos dos internacionalistas, como direitos consuetudinários do jure gentium ou servitudes internationales. (PCA, 2009, apud. ICJ, 1960).

  1.  CASO SAARA OCIDENTAL. PARECER CONSULTIVO.

Já mencionado em tópicos anteriores, o parecer consultivo deliberado nos relatórios de 1975 pela Corte Internacional de Justiça, corrobora o entendimento acerca do princípio dos direitos tradicionais tribais previamente mencionados nesse estudo.

Reiteramos que conforme trecho da conclusão do parecer opinativo, a corte reitera o poder probatório documental e histórico referente a situação específica aventada no caso do Saara Ocidental, vejamos[39]:

“As tribos, em suas migrações, tinham pastagens, terras cultivadas e poços ou charcos em ambos os territórios, e seus cemitérios em um ou outro território. Esses elementos básicos do modo de vida dos nômades, como afirmado anteriormente neste Parecer, eram, em certa medida, objeto de direitos tribais, e seu uso era geralmente regulado pelos costumes. Além disso, as relações entre todas as tribos da região em assuntos como confrontos intertribais e resolução de disputas também eram regidas por um corpo de costumes intertribais. Antes da colonização do Saara Ocidental pela Espanha, esses vínculos legais não tinham nem poderiam ter outra fonte além dos usos das próprias tribos ou da lei corânica. Assim, embora não tenha sido demonstrado que o Bilad Shinguitti tenha existido como pessoa jurídica, os povos nômades do país Shinguitti devem, na opinião da Corte, ser considerados como possuidores de direitos no período relevante, incluindo alguns direitos relativos à as terras por onde migraram. Esses direitos, conclui a Corte, constituíam vínculos jurídicos entre o território do Saara Ocidental e a "entidade da Mauritânia", sendo esta expressão usada para denotar as várias tribos que vivem nos territórios dos Bilad Shinguitti que agora fazem parte da República Islâmica da Mauritânia. Eram laços que não conheciam fronteiras entre os territórios e eram vitais para a própria manutenção da vida na região. ” (ICJ, 1975, p. 64 e 65)[40].

A conclusão acima refere-se necessariamente ao modo de vida e cultura das tribos nômades do Saara Ocidental e como pode ser facilmente observado na leitura do trecho supramencionado, o relator se preocupou na preservação não somente do estilo de vida das tribos que utilizavam ambos os territórios para sua subsistência, como também pela mais pura preservação da sobrevivência dos membros das tribos.

Tratam-se de décadas de utilização do território e recursos naturais que perfazem não somente o estilo de vida como também todo o resgate e manutenção da cultura e ensinamentos passados por gerações, que poderiam ser perdidos com um resultado negativo, baseado tão somente em delimitação de terras e fronteiras.

  1. ESTADO DA ARTE PÁTRIO. DISCUSSÃO E DOUTRINA NACIONAL SOBRE A QUESTÃO DA POSSE DE TERRAS INDÍGENAS E MARCO TEMPORAL DAS DEMARCAÇÕES TERRITORIAIS.

No decorrer do estudo aqui apresentado, fora verificada diversas jurisprudências internacionais acerca do tema, o marco temporal que fora delimitado e analisado no caso da área de Abey-Sudan, as questões das posses e utilização de terras e recurso em praticamente todos os julgados da Corte Permanente de Arbitragem bem como da Corte Internacional de Justiça.

O tópico a seguir tratará agora da discussão interna sobre o tema. Em âmbito pátrio fora proposto Projeto de Lei que deliberará (caso aprovado) sobre novas regras e regulamentações que afetam diretamente a questão das delimitações e demarcações de terras indígenas.

Um dos maiores motivos do interesse no tema fora de que não somente a questão é amplamente debatida (e até o presente momento, unânime) em relação aos direitos tradicionais dos povos originários, como também, que o Estado de Mato Grosso do Sul (estado de origem desse autor) possui uma das maiores populações indígenas do Brasil, o que necessariamente afetaria e muito, não só essa coletividade, como também envolveria consequentemente debates econômicos e sociais acerca das terras que seriam ou não delimitadas, suprimidas ou acrescidas no Estado.

Para continuar o debate doutrinário sobre a questão dos direitos à posse, propriedade e utilização de recurso que recaem em âmbito pátrio, se faz necessária primeiramente entender o que o projeto de Lei n. n. 490/2007 pretende dispor, as declarações e convenções em contrário e as decisões judiciais que já permeiam o debate.

Assim, começaremos com o projeto de Lei supracitado que altera a Lei n. 6.001/73 (Estatuto do índio) que em sua justificativa pretende delimitar a competência das demarcações de terras indígenas única e tão somente à União pelo poder executivo (PEREIRA, 2007).

Em breve suma, menciona que a União delega à FUNAI (Fundação Nacional do Índio) as prerrogativas relativas aos estudos, análises, entrevistas com membros das tribos e consequentemente os relatórios que baseiam o deferimento ou não das demarcações de terras que serão posteriormente encaminhadas ao poder executivo nacional e esse, assim, aprovaria e daria sequência aos trâmites necessários.

Continua mencionando que a demarcação de terras possui interesses além da questão indígena, interesses públicos e privados, que elenca como exemplo, questão fundiária, segurança nacional, proteção ambiental, infra estrutura, agropecuária entre outras, dispomos aqui trecho da fundamentação do legislador:

“No entanto, vemos, no cotidiano, que as áreas reivindicadas e que, por isso, são objeto de demarcação, envolvem interesses diversos, tanto públicos quanto privados. Isto que os atos demarcatórios implicam em sobreposições de áreas indígenas às áreas de proteção ambiental, estratégicas para a segurança nacional, como, por exemplo, as localizadas na faixa de fronteiras, de propriedades privadas destinadas à produção agropecuária e outras atividades produtivas importantes para a viabilidade econômica de Estados e Municípios, aquelas ocupadas por obras de infraestrutura, como estradas, redes de energia elétrica e telefônica, de prospecção mineral e recursos hídricos, áreas de aglomeração urbana e núcleos habitacionais, onde se localizam, também, os prédios destinados à administração local, à educação, à saúde, à moradia, etc.” (PEREIRA, PL n. 490/2007, p. 03).

O projeto de lei supracitado menciona sobre a competência, porém possui apensos. O Deputado Zequinha Marinho[41], propôs alterar o art. 19 Lei nº 6.001, de 1973 ao tentar novamente “adequar” a legislação indígena com a nova constituição de 1988.

A questão da mudança das demarcações e delimitações das terras indígenas apenas tomou forma a partir do Projeto de Lei n. 2.311/2007 de autoria do Sr. Edio Lopes, que propões a regulamentação da Lei Federal nos termos da Carta Magna e altera o artigo 19 da Lei n. 6.001/73.

O então Deputado menciona sobre a complexidade do tema e como o mesmo inferiria nas vidas da população indígena e não indígena, mencionando até mesmo sobre os atos realizados na pratica pelo servidor designado pela FUNAI, especialista em antropologia e que tais questões extrapolam os limites dos órgãos federais de assistência à população indígena (FUNAI) devendo a competência ser delimitada apenas ao Congresso Nacional, vejamos:

“Atualmente, o Poder Executivo edita um decreto para homologar a demarcação realizada pelo Ministério da Justiça, através da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, órgão federal que lhe é subordinado. Por falta de regulamentação, o processo de demarcação das terras indígenas rege-se por decreto. Com apoio no Decreto n° 1.775, de 1996, a demarcação é fundamentada em trabalhos desenvolvidos por “antropólogo de qualificação reconhecida”, que elaborará o estudo antropológico de identificação, segundo estabelecido no art. 2° do mencionado Decreto. ”

Assim como:

“Ademais, as demarcações das terras indígenas, pela sua complexidade, envolvem questões que extrapolam os limites de competência do órgão federal de assistência aos índios, refletindo em outras esferas do Poder Público, no desenvolvimento social e econômico dos Municípios e Estados envolvidos e nos direitos e garantias fundamentais. Portanto, é o Congresso Nacional o foro competente para examinar, debater e votar sobre matéria tão complexa, pois são os Deputados e Senadores detentores da legítima representação popular”  

O debate se acirra na questão aos substitutivos do artigo 17[42] que anteriormente denomina às terras indígenas às terras ocupadas ou habitadas pelos sivículas e terras de domínio das comunidades indígenas e sivículas (BRASIL, Lei n. 6.001/73), acrescendo incisos e alterando o caput, in verbis:

“Art. 1o O artigo 17 da Lei no 6.001, de 19 de dezembro de 1973, passa a ter a seguinte redação:

“Art. 17. São indígenas as terras que, comprovadamente, atendam aos seguintes requisitos: I – sejam por eles atualmente habitadas em caráter permanente, considerando-se a atualidade como o momento da promulgação da Constituição Federal de 1988; II – sejam utilizadas para suas atividades produtivas; III – sejam imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar; IV – sejam necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.” [43].

No mesmo texto, o relator propõe a mudança também no artigo 19, essa de suma importância pois em seu §3º inciso IV que veda a ampliação de terras indígenas em situações que extrapolem o artigo 20 da Lei supracitada e em seu §4º acrescenta:

“§ 4 o Serão desafetadas as terras indígenas demarcadas, ou partes delas, que sejam abandonadas pelos índios, ou que não sejam utilizadas segundo os usos, costumes e tradições indígenas, ou cuja utilização não atenda a, pelo menos, um dos requisitos estabelecidos no art. 17 desta Lei, ou cuja utilização indevida ou ilegal descaracterize a sua finalidade”

Verifica-se uma clara inobservância aos princípios de direitos tradicionais dos povos originários ao mencionar que as terras poderão ser desafetadas por conveniência da União, quando essa entender que as terras não estão sendo utilizadas segundos seus usos, costumes e tradições, porém, no projeto de Lei n. 490/2007 o legislador propõe que o órgão Federal especializado (FUNAI) não possua a mesma competência para dirimir as questões indígenas por ausência de competência.

Entende-se que a FUNAI apenas teria função consultiva e protocolar, porém verifica-se que o órgão federal possui o maior conhecimento acerca da cultura indígena e que com o vigor da Lei sua técnica e conhecimento do tema, poderiam sequer ser levado em conta na questão de desapropriação das terras por suposta “não utilização da mesma em relação a seus costumes e tradições”.

O próprio projeto entra em contradição ao mencionar em suas justificativas, quase todas baseadas nos mesmos argumentos, que existem hoje interesses diversos sobre as demarcações, porém, se retirarmos a competência do órgão especializado e acrescentar a pura discricionariedade à União, que não possuem o conhecimento histórico e técnico sobre o tema, nos vemos em uma situação em que novos “interesses diversos” poderão surgir afim de demarcação ou desafetação de terras indígenas.

No curso do projeto de lei e seus substitutivos, houveram diversos questionamentos em favor à população indígena, inclusive com supressão de caput, parágrafos e incisos, inclusive os mencionados acima, afim de se proteger e resguardar os direitos das populações indígenas.

Conforme previamente mencionado os argumentos dos legisladores sempre se baseiam no artigo 231[44] da Constituição federal, porém o texto proposto ao projeto de lei e substitutivos são assimétricos à Carta Magna Pátria, em especial aos parágrafos §4º e §5º que tratam respectivamente da inalienabilidade, indisponibilidade e imprescritibilidade das terras de posse indígena[45] e vedação à remoção de grupos indígenas de sua terra salvo situação de catástrofe ou epidemia[46].

Trata-se de projeto de lei que busca regulamentar normal federal mas que consequentemente busca alteração normativa de cláusula pétrea à Constituição Federal, que notoriamente sabido, versa sobre impossibilidade expressa de modificação ou reforma.

A professora Daize Fernanda, menciona sobre a segurança Jurídica da questão:

“A partir do instante em que o cidadão encontra-se desprotegido contra as leis retroativas que afetam seus direitos ou quando é frustrada sua justa confiança na ordem jurídica consolidada, as relações tornam-se instáveis e inseguras juridicamente. Dessa maneira, é função do Estado proporcionar segurança jurídica nas relações sociais, sobretudo, em relação ao gozo de direitos fundamentais, como é o direito dos povos indígenas ao território tradicionalmente ocupado.” (WAGNER, FARIAS, 2020, p. 381-382).

Já mencionado, em voto datado de 09 de setembro de 2021, o relator, Ministro Edson Fachin sinalizou pelo entendimento de que os direitos das comunidades indígenas são direitos fundamentais e que não podem ser necessariamente tratados como direito privado de posse, por não possuir para esses povos tradicionais, quaisquer valor comercial e sim, tradicional e até mesmo espiritual, de identidade e de existência.

As autoras demonstram profunda preocupação na transferência das competências para demarcação de terras da FUNAI, como órgão federal especializado, para um Ministério hierarquicamente subordinado à decisões discricionárias da Administração do Executivo Federal e concluem que tal delimitação de competência À MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) seria uma espécie de tentativa de desestruturação da FUNAI, o que causaria enorme insegurança jurídica à população indígena brasileira já que “seus direitos originários as terras tradicionalmente ocupadas poderiam ser desqualificados e desconstituídos” (WAGNER, FARIAS, 2020, Op. Cit., p. 396).

Samara Carvalho cunha o termo “involução interpretativa” ao mencionar as decisões do STF[47] que diante de diversas reinterpretações da norma e decisões envolvendo conflitos possessórios com base em marcos temporais e condicionantes diversas, acabam por trazer imensa insegurança jurídica além de lesar os direitos territoriais dos povos indígenas envolvidos (SANTOS, 2020, p. 85).

Ao que pese os argumentos dos nobres Deputados, que destacamos, o referente aos supostos “interesses diversos” dos ramos públicos e privados, cumpre concordar que as demarcações indígenas possuem profundo significado que atingem além das normas públicas nacionais e internacionais.

A questão da proteção das terras indígenas e das demarcações possuem caráter de proteção também, ambiental, nas palavras do professor Tomporoski, a demarcação de terras indígenas promove a devida preservação ambiental e proteção de florestas de modo que o estilo de vida, a cultura, o conhecimento, as tradições e costumes desses povos acabam por promover um equilíbrio, sustentabilidade e utilização mais contida dos recursos naturais ali protegidos (TOMPOROSKI, BUENO, FLENIK e MAIA, 2020, p. 15).

CONCLUSÃO

No decorrer do presente artigo fora possível perceber a clara preocupação dos Tribunais Internacionais em relação a casos de natureza privativa de direitos tradicionais a povos originários, em especial em relação a sua terra, recursos e territórios.

A Corte Permanente de Arbitragem é harmoniosa no entendimento de vedação e detrimento de direitos relativos a posse e propriedade dos povos tribais que na terra possuem vínculos e marcas ancestrais que lhes remetem a sua cultura, origem, costumes e tradições.

Os dois casos da CPA, objetos de estudo nesse trabalho, área do Abey-Sudão e Eritrea-Yemen, evidenciam o resguardo aos direitos tradicionais das tribos originárias no intuito fim de preservação e conservação não somente dos direitos a posse, propriedade e gozo da terra e de seus recursos, como também reconhecendo que essas tribos fazem dessas tradições verdadeiros rituais passados através do conhecimento de gerações para os descentes de seus membros.

As delimitações impostas no âmbito internacional foram consideradas à nível de Soberania dos Estados, porém entenderam os juízes das cortes internacionais que nem mesmo a soberania e território de um Estado poderiam cercear os direitos tradicionais dessas tribos, incluindo até mesmo direitos considerados secundários como o direito de pastoreio, de pesca e de passagem.

Em unanimidade doutrinária, fora possível perceber que as decisões tanto vinculativas, quanto consultivas à nível internacional, buscam preservar os direitos tradicionais da população indígena, baseando-se no vínculo umbilical e ancestral que esse povo denota à terra e ao meio ambiente.

O caso da área Abey-Sudão ainda possui uma característica que esse autor considera extremamente interessante, a demonstração de força probatória imputada aos depoimentos pessoais, documentais e históricos dos membros das tribos, que foram devidamente valorados para questões particulares de cada caso, mas que claramente contribuíram para o decisório final do Tribunal Internacional.

Ressaltamos isso, pois na contramão do entendimento internacional se encontram as discrepâncias nacionais. Ao que pesem os avanços da jurisprudência global, o caso pátrio parece regredir.

A nível internacional preza-se pela segurança jurídica e cultural desses povos, não somente buscando a preservação de direitos básicos como a sobrevivência, bem estar e subsistência desses povos, que as vezes até mesmo dependem da sazonalidade das cheias de rios, das pescas, da migração nômade tanto de pessoas quanto de animais para pastoreio, como também da importância que esses povos possuem na preservação da natureza, mares, rios e florestas, cujo estilo de vida se preceitua na harmonia entre ser humano e terra.

No Brasil porém, parece haver um retrocesso jurídico na tentativa de regulamentar norma já fundamentada em cláusula pétrea. A discrepância é tanta que se utiliza da norma da Carta Magna para justificar alterações à mesma em clara assimetria ao texto ali contido.

Tenta-se desde tirar de órgão federal especializado, cuja história já demonstrou a árdua batalha pela preservação de direitos da população indígena, com dezenas de estudos, coleta de material bibliográfico e histórico dessa população, competência para as demarcações e delimitações de terra de propriedade histórica tribal, até desclassificar e ironizar a classificação técnica de servidores que dedicaram suas vidas a estudos sobre o tema.

Tal tentativa de enfraquecer os órgãos especializados e seus servidores trata-se de um claro empreendimento ao enfraquecimento organizacional do órgão que consequentemente, traria prejuízos enormes para as gerações vindouras que dependem da terra para a manutenção de sua cultura, costumes e até mesmo de sua história.

A jurisprudência internacional nos mostrou uma saída para casos de possíveis injustiças contra esses povos originários. Entende o autor que uma proposição de arbitragem perante a Corte Permanente de Arbitragem se faz via de acesso à justiça contra prováveis situações de litígio em desfavor da população indígena pátria.

Os julgados a nível internacional favorecem os argumentos baseados nos princípios de preservação dos direitos tradicionais e podem embasar futuros questionamentos e recursos contra projetos de lei que podem necessariamente ceifar prerrogativas primordiais e até mesmo secundárias dos povos originários que necessitam precipuamente dessa segurança jurídica nos mais reforçados pilares da lei.

Além da segurança jurídica, a doutrina também nos mostra que as justificativas do projeto de lei em comento são divergentes do conceito prático atual. Não há que se falar em diminuição de prerrogativas e competências de órgão federal com base em supostos (e nem ao menos comprovados) interesses diversos dos setores públicos e privados quando a pratica demonstra que os povos originários não somente fazem valer da terra e seus recursos sua subsistência e cultura ancestral, como também a nível de preservação ambiental e equilíbrio da harmonia ser humano e natureza.

O entendimento da Corte Permanente de Arbitragem nos leva a entender que a visão sistêmica da Corte se funda na premissa de que, independente de quaisquer movimentações políticas, sociais e econômicas que possam a vir alterar fronteiras e delimitações de terras inter Estados, os princípios de direito internacionais devem ser mantidos afim de se preservar os direitos tradicionais dos povos originários, visando a manutenção de seus costumes e tradições como forma de estabilidade e continuação de memória ancestral dessa cultura para as gerações vindouras.

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[1] Referido no caso julgado como “GoS: Governament of Sudan”;

[2] “SPLM/A: Sudan People’s Liberation Movement/Army”;

[3] Protocolo sobre “A Resolução do Conflito de Abyei”, assinado pelas Partes em 26 de maio, 2004;

[4] Protocolo de Abyei, seção 1.1.2;

[5] Do original: “The territory [of the Abyei Area] is defined as the area of the nine Ngok Dinka chiefdoms transferred to Kordofan in 1905.”;

[6] Província do Sudão;

[7] Rio que corre através da província do Alto Nilo;

[8] Província do Sudão;

[9] Definição do território da área de Abyei;

[10] Também conhecida como Messeria ou Messiria; tribo nômade de árabes Baggara;

[11] Eritrea-Yemen, Arbitral Award, First Stage of the Proceedings, at para. 126 (Permanent Court of Arbitration, available at http://www.pca-cpa.org);

[12] Anglo-Iranian Oil Co. Case (United Kingdom v. Iran) (Preliminary Objections) Judgment of July 22, 1952, ICJ Reports 1952, p. 93, 103;

[13] Western Sahara, Advisory Opinion, ICJ Reports 1975, p. 12, 65;

[14] Right of Passage over Indian Territory (Portugal v. India), ICJ Reports 1960, p. 6, 35-43;

[15] Maritime Delimitation in the Area between Greenland and Jan Mayen (Denmark v. Norway), ICJ Reports 1993p. 38, paras. 72-78;

[16] Através do Decreto n. 591, de 06 de julho de 1992.

[17] Através do Decreto n. 7.030, de 14 de dezembro de 2009.

[18] Através do Decreto n. 678, de 06 de novembro de 1992.

[19] Através do Decreto n. 19.841, de 22 de outubro de 1945.

[20] A valoração das provas testemunhais e orais por parte da CPA traz ao estudo uma relevância especial em relação à questão interna da demarcação de terras indígenas no Brasil, além de dirimir acerca do marco temporal válido para análise de tais delimitações como base de entendimento de juristas internacionais para direitos tradicionais dos povos, que faz parte do relatório inicial do projeto de lei n. 490/2007.

[21] United Nations General Assembly. “United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples”. 107th plenary meeting. New York – US. 13 Sep. 2007. Available at: https://www.un.org/development/desa/indigenouspeoples/wpcontent/uploads/sites/19/2018/11/UNDRIP_E_web.pdf. Acess in: 28 Jan. 2022;

[22] Do original em inglês: “Recognizing the urgent need to respect and promote the inherent rights of indigenous peoples which derive from their political, economic and social structures and from their cultures, spiritual traditions, histories and philosophies, especially their rights to their lands, territories and resources,”

[23] Do original em inglês: “Convinced that control by indigenous peoples over developments affecting them and their lands, territories and resources will enable them to maintain and strengthen their institutions, cultures and traditions, and to promote their development in accordance with their aspirations and needs,”

[24] United Nations General Assembly. Op. Cit., 2007.article 3º;

[25] CFESS. CFESS Manifesta: Dia da luta indígena. Conselho Federal de Serviço Social. Gestão Tempo de Luta e Resistência. P. 02. Brasília, 19 abr. 2012. Disponível em: <http://www.cfess.org.br>. Acesso em: 28 Jan. 2022.

[26] United Nations General Assembly. Op. Cit., 2007.article 10;

[27] Do original em inglês: “Article 8 1. Indigenous peoples and individuals have the right not to be subjected to forced assimilation or destruction of their culture. (b) Any action which has the aim or effect of dispossessing them of their lands, territories or resources;”;

[28] Também conhecida como Messeria ou Messiria; tribo nômade de árabes Baggara;

[29] Do original em inglês: “The GoS, by letter dated March 30, 2009 addressed to the PCA, informed the Tribunal that a news item on March 29, 2009 in the Sudanese daily newspaper Al-Ayam alleged that one of the Ngok Dinka witnesses for the GoS, Mr. Majid Yak, Secretary of Local Administration of Abyei, was threatened with being “physically eliminated” by members of the SPLM/A if he were to leave for The Hague to testify at the hearings. In addition to Mr. Yak, the GoS further claimed that, upon inquiry, its other Ngok Dinka witnesses, Messrs. Zakaria Atem, Majak Matit and Ayom Matit admitted to being repeatedly harassed by SPLM/A members either to deter them from testifying at the hearings or to convince them to change their testimony.”

[30] GoS Counter-Memorial, paras. 48-53;

[31] Ver item 1. “Preliminary Remarks on the Appreciation of the Evidentiary Record”, tópico 717. GOS-SPLM/A Final Award July 22, 2009 Page 247;

[32] Do original em inglês: “Notwithstanding the challenges created by the use of oral histories as proof of historical facts, the laws of evidence must be adapted in order that this type of evidence can be accommodated and placed on an equal footing with the types of historical evidence that courts are familiar with, which largely consists of historical documents. This is a long-standing practice in the interpretation of treaties between the Crown and aboriginal peoples”.

[33] Aparentemente houve erro formal na publicação do julgado, às páginas 259, item 748 do julgamento final do caso n. GOS-SPLM/A, pois há menção do artigo segundo ©, porém em análise às regras da Corte Permanente de Arbitragem, verifica-se que trata-se do artigo terceiro, alínea “c”.

[34] Do original em inglês: “3. The notice of arbitration shall include the following: (c ) Identification of the arbitration agreement that is invoked;”

[35] Do original em inglês: “[t]he Misseriya and other nomadic peoples retain their traditional rights to graze cattle and move across the territory of Abyei.”

[36] Do original em inglês: “Abyei is an oil-rich region situated along the borders of Sudan and South Sudan. The Abyei Area covers 4,000 square miles of desert, farmland, and oil fields located along the ill-defined border between Sudan and South Sudan. Abyei is claimed by both countries and has been a source of conflict in the Sudan for over 50 years. [...]

[37] Do original em inglês: “i. the sovereignty found to lie with Yemen entails the perpetuation of the traditional fishing regime in the region, including free access and enjoyment for the fishermen of both Eritrea and Yemen”.

[38] Do original em inglês: “76. It appears to the Court that the seasonal migration of the capelin  presents a pattern which, north of the 200-mile line claimed by Iceland,  may be said to centre on the southern part of the area of overlapping  claims, approximately between that line and the parallel of 72" North latitude, and that the delimitation of the fishery zone should reflect this fact.  It is clear that no delimitation in the area could guarantee to each Party the  presence in every year of fishable quantities of capelin in the zone allotted  to it by the line. It appears however to the Court that the median line is too  far to the west for Denmark to be assured of an equitable access to the  capelin stock, since it would attribute to Norway the whole of the area of  overlapping claims. For this reason also the median line thus requires to  be adjusted or shifted eastwards (cf. paragraph 71 above).”

[39] Do original em inglês: “The tribes, in their migrations, had grazing pastures, cultivated lands, and wells or water-holes in both territories, and their burial grounds in one or other territory. These basic elements of the nomads' way of life, as stated earlier in this Opinion, were in some measure the subject of tribal rights, and their use was in general regulated by customs. Furthermore, the relations between all the tribes of the region in such matters as inter-tribal clashes and the settlement of disputes were also governed by a body of inter-tribal custom. Before the time of Western Sahara's colonization by Spain, those legal ties neither had nor could have any other source than the usages of the tribes themselves or Koranic law. Accordingly, although the Bilad Shinguitti has not been shown to have existed as a legal entity, the nomadic peoples of the Shinguitti country should, in the view of the Court, be considered as having in the relevant period possessed rights, including some rights relating to the lands through which they migrated. These rights, the Court concludes, constituted legal ties between the territory of Western Sahara and the "Mauritanian entity", this expression being taken to denote the various tribes living in the territories of the Bilad Shinguitti which are now comprised within the Islamic Republic of Mauritania. They were ties which knew no frontier between the territories and were vital to the very maintenance of life in the region”.

[40] Ver em: Western Sahara, Advisory Opinion, ICJ Reports 1975, p. 64 and 65. Top. 152.

[41] Ver em apensos ao Projeto de Lei n. 490/2007;

[42] Art. 17. Reputam-se terras indígenas: I - as terras ocupadas ou habitadas pelos silvícolas, a que se referem os artigos 4º, IV, e 198, da Constituição;                    (Regulamento)            (Vide Decreto nº 22, de 1991)            (Vide Decreto nº 1.775, de 1996) II - as áreas reservadas de que trata o Capítulo III deste Título; III - as terras de domínio das comunidades indígenas ou de silvícolas.

[43] Ver SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI No 490, DE 2007, E AOS APENSADOS: PROJETOS DE LEI No 1.218/07, 2.302/07 E 2.311/07. Apenso ao PL n. 490/2007. P. 50;

[44] Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

[45] Art. 231... § 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

[46] Art. 231... § 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, "ad referendum" do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.

[47] Ao que pese a visível evolução da Corte no caso do Pl. n. 490/2007, em especial nos julgados dos ministros Fachin e Barroso sobre o tema, necessário se faz mencionar que a autora busca em questões passadas julgados contraditórios e que possam ter prejudicado populações indígenas com base em alegações diversas, como marco temporal, competências de demarcações e etc.